Produtores do Centro-Oeste relatam cheques travados, plantas em silêncio e incerteza sobre próximas entregas. O caixa apertou e a pressa cresceu.
O Frigorífico Balbinos Agroindustrial, de Sidrolândia (MS), entrou com pedido de recuperação judicial em 31 de outubro de 2025, após suspender atividades e declarar crise de liquidez. Pecuaristas apontam notas vencidas desde meados de outubro, enquanto a empresa alega investimentos pesados, juros altos e falta de boi no preço como gatilhos do rombo.
Crise chega à porteira
A indústria interrompeu a compra de gado e colocou os funcionários em férias coletivas desde 10 de outubro. Fornecedores relatam que a paralisação serviu para empurrar pagamentos. Vários produtores foram à Justiça pedir bloqueio de contas, penhora de bens e arresto de animais, tentando preservar algum lastro para receber.
Informações de mercado indicam um débito com pecuaristas entre R$ 30 milhões e R$ 50 milhões, enquanto a companhia declarou endividamento total de R$ 120,8 milhões. O quadro pressiona uma operação que emprega cerca de 350 pessoas diretamente e outras 250 indiretamente.
Pedido de recuperação judicial em 31/10/2025, atividades suspensas e caixa travado: credores enfrentam um “stay period” de 180 dias sem cobrança judicial.
Quem está na fila de pagamento
- Banco Daycoval — R$ 22,4 milhões
- Banco Sofisa — R$ 13,9 milhões
- Banco do Brasil — R$ 4,8 milhões
- Fundo Unique FIDC — R$ 3,5 milhões
- Produtores e fornecedores — valores em apuração; estimativa de R$ 30 a R$ 50 milhões
| Indicador | Valor | Observação |
|---|---|---|
| Endividamento declarado | R$ 120,8 milhões | Consta no processo |
| Dívida de curto prazo | R$ 32,5 milhões | Relatada em documentos |
| Dívida de longo prazo | R$ 130 milhões | Difere do total informado |
| Colaboradores diretos | 350 | Planta de Sidrolândia (MS) |
| Colaboradores indiretos | 250 | Serviços associados |
| Stay period | 180 dias | Suspende execuções e protestos |
| Férias coletivas | Desde 10/10 | Operação paralisada |
| Data do pedido | 31/10/2025 | Vara Regional de Campo Grande |
Por que a conta não fecha
A direção cita mais de R$ 50 milhões em modernização da planta, juros altos, câmbio volátil e boiada mais escassa no Estado. O avanço de usinas de etanol de milho, florestas de eucalipto e citrus sobre áreas de pasto encareceu a arroba e apertou as margens de abate.
Sem boi no preço, o frigorífico perde giro e reduz escala. A cada dia parado, fornecedores seguram o fôlego e municípios sentem a freada do consumo local.
Investimento alto somado a crédito caro e gado disputado corrói o capital de giro e as margens de abate.
O que muda com a recuperação judicial
A recuperação judicial, prevista na Lei 11.101/2005, congela execuções por 180 dias, enquanto a empresa apresenta um plano para renegociar dívidas por classe de credores. O plano precisa de aval em assembleia. Sem acordo, a falência se torna possibilidade concreta.
Durante o período de proteção, pagamentos podem sofrer suspensão, reprogramação e deságio. Quem vendeu gado e não recebeu deve habilitar o crédito no processo e avaliar pedidos de arresto quando couber, sempre com assessoria jurídica.
Impacto além do curral
O movimento não é isolado. Levantamentos da Serasa Experian apontam salto superior a 300% nos pedidos de recuperação judicial do agro em 2024. Em 2025, grandes grupos de proteína, cooperativas e tradings reforçaram a estatística. Bancos e fundos passaram a exigir garantias mais robustas e reduziram prazos.
Quando um frigorífico concentra compras numa região e trava pagamentos, o efeito repercute em transportadores, confinamentos, lojas agropecuárias e no comércio da cidade. A cadeia patina e o crédito seca.
Você entregou gado e não recebeu? Veja o passo a passo
- Separe notas fiscais, romaneios, guias de trânsito animal e comprovantes de entrega.
- Habilite o crédito no processo de recuperação judicial dentro do prazo legal.
- Avalie, com advogado, pedido de arresto de bens ou bloqueio de valores quando houver lastro.
- Negocie garantias reais para qualquer nova entrega: aval, hipoteca, penhor de animais ou CPR com garantia.
- Formalize tudo por escrito e registre em cartório quando couber.
- Evite novas cargas sem contrato com cláusulas de vencimento, multa e reserva de domínio.
Sem garantia, não carregue. Contrato com reserva de domínio mantém a propriedade do gado até o pagamento.
Como isso mexe com o seu caixa
Simulação rápida: você vende 200 bois de 18 @ a R$ 300/@. Valor total de R$ 1.080.000. Se o pagamento atrasa 60 dias e seu custo financeiro é de 2% ao mês, a conta queima R$ 43.200 em juros no período. Essa diferença compromete a compra de reposição, o trato no cocho e o fluxo de despesas da fazenda.
Quem confina precisa redobrar cuidado com diárias, ração e contratos de boitel. Uma quebra no recebimento empurra o produtor a vender apressado e perder preço. Planeje lotes menores e escalonados durante o período de incerteza.
Estratégias para atravessar o ciclo
Negócio com proteção
- Travas de preço com frigoríficos concorrentes e repartição de risco entre plantas.
- CPR com garantia real e averbação, vinculando animais via GTA.
- Venda em leilões com pagamento garantido por depositário ou seguradora do evento.
- Antecipação de recebíveis somente com cessão formal e análise de custo efetivo total.
O que observar no plano da empresa
- Calendário de pagamentos por classe de credor e percentuais de deságio.
- Garantias apresentadas, bem como a destinação de caixa para capital de giro.
- Metas operacionais: compra de gado, escala de abate e retomada de atividade.
- Governança: auditoria independente, transparência e prestação de contas mensal.
O Sindaves comunicou aos empregados previsão de retorno das operações em 6 de novembro. A direção do Balbinos ainda não apresentou posicionamento público detalhado. Enquanto isso, quem fornece gado deve agir com cautela, pedir garantias e formalizar todo crédito.
Para acompanhar o tema, vale entender termos como “stay period”, “plano de recuperação” e “assembleia de credores”. Um calendário claro, combinado a garantias efetivas e a uma retomada gradual de abates, ajuda a reduzir risco de calote em cadeia e dá fôlego ao produtor na virada do ciclo do boi.


