Vento nordeste persistente, maré cheia e solo seco mexem com o Litoral Norte do RS e preocupam quem já arruma a mala.
Em Xangri-Lá, especialmente na praia de Maristela, a areia avança sobre passarelas, calçadas e acessos. Moradores e veranistas relatam dificuldade para chegar ao mar, mesmo após limpezas frequentes. O cenário cresce às vésperas da temporada e acende o debate sobre como equilibrar uso da praia e proteção ambiental.
O que está acontecendo nas dunas
As dunas se moveram nas últimas semanas e passaram a cobrir trechos de ruas e passagens. O vento nordeste, forte e recorrente, empurra a areia para o interior. Sem vegetação suficiente para segurar os grãos, o empilhamento se acelera e as passarelas viram corredores de acúmulo.
Quem frequenta a região há mais de dez anos relata surpresa com o volume e a velocidade desse avanço. O acesso carregando cadeiras, guarda-sol e crianças virou um esforço maior, sobretudo para idosos e famílias com mobilidade reduzida.
Sem raízes para estabilizar a superfície, cada rajada atua como uma esteira rolante, levando a areia das cristas para as áreas urbanas.
Vento nordeste e o ciclo das areias
O nordeste sopra acelerado nesta época e alinha os grãos em “saltos” curtos, num processo chamado saltação. Quando o solo está seco e a vegetação rareia, a migração aumenta. O monitoramento feito por pesquisadores desde 2018 mostra fases de intensificação, seguidas por períodos de relativa estabilidade, sempre dependentes do regime de ventos e de ressacas.
As dunas não são inimigas da praia. Elas agem como anteparo natural contra a erosão e seguram o avanço do mar em eventos de ressaca. O desafio em Maristela está em manter o acesso sem transformar essa barreira em uma rampa livre para a areia.
Dunas funcionam como uma muralha natural: removê-las de forma ampla fragiliza a costa e expõe casas e ruas à erosão.
Como o poder público atua
A prefeitura confirma que o município possui mais de 70 passarelas e que equipes removem areia de forma constante para garantir circulação. A estratégia inclui “cobertura morta” — como cascas e restos vegetais — sobre trechos vulneráveis e a instalação de cercas de contenção. Em dias de “nordestão”, o serviço precisa ser repetido.
Especialistas defendem integrar as ações em um plano de manejo de dunas, com metas, monitoramento e licenciamento ambiental. A coordenação com órgãos reguladores evita obras improvisadas que, embora bem-intencionadas, podem agravar a erosão.
Plano de manejo bem desenhado organiza a limpeza, orienta a recuperação da vegetação e define onde cercas e passarelas funcionam melhor.
| Ação | Responsável | Objetivo |
|---|---|---|
| Plano de manejo de dunas | Prefeitura + Fepam | Definir regras de uso e proteção |
| Remoção pontual de areia | Prefeitura | Desobstruir passarelas e ruas |
| Barreiras e cercas | Prefeitura (licenciada) | Reduzir migração da areia |
| Recuperação de vegetação | Município + comunidade | Fixar dunas e estabilizar taludes |
O que a lei permite nas áreas de dunas
As áreas de dunas integram uma faixa de preservação permanente, com regras específicas de ocupação. Intervenções como cercas, barreiras e remoção de areia precisam constar do Plano de Manejo de Dunas e passar por licenciamento. Cabe ao município mapear conflitos, justificar medidas e solicitar autorização; o órgão ambiental avalia a viabilidade técnica e legal.
Duna é área protegida: sem plano licenciado, a ação pode ser barrada por uso inadequado do solo em área de preservação.
Os impactos do dia a dia
Para quem chega com carrinho de praia, caixa térmica e criança no colo, cada degrau de areia vira um obstáculo. Comerciantes veem a clientela evitar acessos mais críticos. Moradores relatam acúmulo junto a muros e calçadas, exigindo limpeza recorrente. Em dias de vento forte, a areia suspensa irrita olhos e vias respiratórias e reduz a visibilidade para motoristas nas ruas próximas ao mar.
Dicas práticas para quem vai à praia nos próximos dias
- Prefira horários com vento mais ameno, geralmente no início da manhã e no fim da tarde.
- Use as passarelas sinalizadas; caminhar fora delas acelera a degradação da vegetação de fixação.
- Proteja olhos e pele: óculos com boa vedação e lenço ajudam em rajadas com areia.
- Evite remover areia por conta própria em área de duna; acione a prefeitura para orientar a limpeza.
- Estacione longe das cristas de areia e observe o sentido do vento para não bloquear saídas.
Medidas que tendem a funcionar
A curto prazo, a combinação de remoção seletiva de areia das passarelas, cercas quebra-vento em pontos estratégicos e cobertura morta reduz o volume que chega às ruas. Essas barreiras temporárias “seguram” a areia até que a vegetação se restabeleça.
Para o médio prazo, vale priorizar a recuperação de restinga com gramíneas e arbustos nativos, que criam raízes densas e formam um “tapete” de fixação. Trilhas bem demarcadas, decks elevados e sinalização educativa diminuem o pisoteio que desamarra as dunas. O mapeamento de corredores preferenciais do vento ajuda a posicionar passarelas perpendicularmente às rajadas, diminuindo o efeito funil.
Recuperação da vegetação + barreiras temporárias + passarelas bem posicionadas reduzem soterramentos sem desmontar a proteção natural da praia.
O que pode sair do papel antes da temporada
Um calendário fixo de manutenção das passarelas, revisões pós-vento forte e equipes móveis nos trechos críticos trazem ganhos rápidos. O uso de cercas de madeira baixas em zigue-zague, licenciado, já mostrou boa eficiência em praias com ventos similares. A participação dos condomínios no monitoramento e a comunicação direta com a prefeitura aceleram respostas.
Informações complementares
Transporte eólico de areia intensifica quando as rajadas superam um limiar de velocidade que levanta os grãos do chão. Quanto mais seca a superfície, menor o limiar. Após dias chuvosos, a coesão entre os grãos aumenta e a duna se move menos. Essa dinâmica explica por que um único episódio de vento forte pode soterrar uma passarela recém-limpa.
Há riscos e vantagens convivendo no mesmo sistema. A areia volante incomoda, entope ralos e pode danificar pintura de carros. Por outro lado, a duna amortiza o impacto das ondas altas e diminui a chance de destruição costeira em eventos extremos. O manejo precisa reconhecer esse equilíbrio: abrir caminho para as pessoas sem derrubar o escudo que protege a orla. Para o veranista, a regra de ouro é simples: respeitar a vegetação, usar os acessos oficiais e acompanhar os avisos da prefeitura quando o nordeste ganhar força.


