Após uma madrugada de tiros e blindados, moradores da Penha e do Alemão querem saber o que as câmeras realmente registraram.
A Defensoria Pública do Rio de Janeiro solicitou acesso imediato às gravações das câmeras corporais usadas na megaoperação nos complexos da Penha e do Alemão. O pedido pressiona a Polícia Militar por transparência e questiona a possibilidade de perda de arquivos por falha de bateria, apesar de um contrato prever baterias sobressalentes e bases de recarga para toda a tropa.
O pedido da Defensoria
O Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos da Defensoria encaminhou ofício à Ouvidoria-Geral da PM para obter, sem atraso, todas as imagens captadas durante a Operação Contenção. O documento também requer esclarecimentos formais sobre a disponibilização e o uso de baterias extras pelas equipes mobilizadas.
O movimento ocorre após declaração do secretário da PM, Marcelo Menezes, que admitiu a possibilidade de parte das gravações não existir por esgotamento de bateria ao longo da ação, iniciada de madrugada e prolongada por mais de 12 horas.
Defensoria cobra acesso integral às imagens e explicações sobre o uso de baterias sobressalentes previsto em contrato.
Segundo o ofício, as imagens são chave para reconstruir a dinâmica dos confrontos, apurar responsabilidades e orientar medidas de reparação. A sociedade e as famílias esperam um relato verificável, sustentado por evidências, em uma operação tratada como a mais letal já registrada no estado.
Baterias, contrato e dúvidas que afetam a prova
Um aditivo contratual firmado entre a Secretaria de Estado de Polícia Militar e a empresa L8 Group S.A., identificado como nº 111/2021 e datado de agosto de 2024, determina o fornecimento de baterias sobressalentes e bases de carregamento para todas as unidades da corporação.
Documento oficial: “Deverão ser fornecidas baterias sobressalentes e bases de carregamento para todas as unidades da SEPM.”
A existência dessas previsões levanta questões operacionais: as equipes receberam baterias adicionais? Houve planejamento para revezamento e recarga ao longo da operação prolongada? As bases de carregamento estavam disponíveis nos pontos de apoio? Respostas a essas perguntas podem definir a integridade da prova audiovisual.
- Acesso imediato aos arquivos brutos e íntegros das câmeras corporais.
- Detalhamento do fluxo de distribuição e troca de baterias sobressalentes no dia da operação.
- Registros de bases de carregamento disponibilizadas aos batalhões envolvidos.
- Relatório sobre interrupções de gravação, com motivo, horário e identificação do equipamento.
O que diz a PM e o cenário da investigação
A corporação afirma seguir os procedimentos previstos em decreto estadual para disponibilização de material de câmeras corporais e declara colaboração integral com a Polícia Civil. A apuração criminal e administrativa precisa checar a cadeia de custódia das imagens, verificar logs dos equipamentos e confirmar eventuais falhas técnicas.
Transparência e cadeia de custódia
Para que uma gravação seja válida como prova, é necessário preservar a sequência de manuseio: quem gravou, quando descarregou, onde armazenou e quem acessou. Sistemas de câmera normalmente geram metadados com data, hora, duração, identificação do policial e do dispositivo. A ausência de trechos deve ser explicada com consistência técnica e documental.
| Fato | Detalhe |
|---|---|
| Data da operação | 28 de outubro de 2025, madrugada até a noite |
| Local | Complexos da Penha e do Alemão (Zona Norte do Rio) |
| Efetivo mobilizado | Aproximadamente 2.500 agentes civis e militares |
| Mortes registradas | 121 pessoas |
| Secretário da PM | Marcelo Menezes |
| Contrato de suporte | Aditivo nº 111/2021 (ago/2024) – L8 Group S.A. |
| Itens previstos | Baterias sobressalentes e bases de carregamento para todas as unidades |
Por que as imagens importam para você
As gravações são a linha do tempo visual dos fatos. Elas indicam rota, horário, abordagem, disparos e atendimento após cada confronto. Ajudam a proteger civis e também os policiais, reduzindo disputas narrativas e fortalecendo a apuração técnica.
Sem imagens completas, aumentam as lacunas de prova e a insegurança de quem perdeu familiares ou foi afetado pela operação.
Para moradores, ter acesso ao que foi gravado dá subsídio a pedidos de reparação, contestação de abusos e revisão de protocolos. Para as autoridades, as gravações amparam medidas disciplinares e o aprimoramento de treinamentos e procedimentos táticos.
Como essas câmeras deveriam operar no dia a dia
Câmeras corporais dependem de planejamento simples e contínuo. Equipes precisam sair com baterias carregadas, kits sobressalentes e pontos de recarga. Em ações longas, o revezamento de baterias e a checagem de autonomia entre fases da operação reduzem o risco de interrupção. A política de armazenamento costuma incluir download em base segura, lacre digital e espelhamento em servidor.
A autonomia varia conforme o modelo, a resolução do vídeo e o uso de recursos como áudio contínuo e georreferenciamento. Configurações mais robustas exigem mais energia e pedem gestão ativa de baterias ao longo da jornada.
Boas práticas que protegem a prova
- Programar a ativação automática em deslocamentos e abordagens.
- Documentar cada troca de bateria em formulário ou sistema interno.
- Transferir os arquivos no menor tempo possível para ambiente seguro.
- Bloquear alterações manuais nos metadados e manter trilha de auditoria.
Próximos passos e o que esperar
Com o ofício entregue, a Defensoria aguarda a liberação organizada dos arquivos, com catálogo de dispositivos, horários e agentes. A análise técnica deve cruzar imagens, metadados e relatos de ocorrência. A Polícia Civil conduz as investigações criminais e pode requisitar perícias independentes em equipamentos e estações de descarregamento.
Se houver falhas, a apuração precisa separar problemas técnicos inevitáveis de eventuais descumprimentos de protocolo. O exame de logs e a compatibilização de dados de rádio, GPS e imagens de helicópteros ajudam a fechar lacunas.
Orientações práticas para moradores e familiares
Quem foi afetado pode fortalecer seu relato reunindo dados verificáveis. Isso ajuda Defensoria, Ministério Público e peritos a localizar trechos específicos nas imagens corporais.
- Anote horários exatos e pontos de referência (rua, esquina, comércio).
- Guarde fotos e vídeos feitos por celulares, com data e hora ativadas.
- Identifique viaturas, prefixos e fardas quando possível, sem se expor a risco.
- Procure canais de atendimento da Defensoria e da Ouvidoria para formalizar o registro.
Informações úteis para ampliar o debate
O termo “cadeia de custódia” descreve o caminho da evidência, do local do fato ao arquivo final. Em vídeo policial, isso envolve o arquivo bruto, os metadados, o equipamento e a estação de descarregamento. Qualquer falha nessa rota pode gerar questionamentos judiciais sobre autenticidade e integridade.
Simulações operacionais mostram que ações de longa duração exigem planejamento elétrico: cálculo de autonomia por patrulha, quantidade de baterias sobressalentes por turno e disponibilidade de bases em pontos de apoio. A vantagem é clara: mais horas de registro contínuo, menos lacunas, maior confiança pública.
Há riscos quando o fluxo depende apenas do retorno ao batalhão para descarregar vídeos. Bases móveis, unidades com gerador e cronogramas de troca no terreno reduzem a pressão sobre a autonomia. Em operações com centenas de agentes, padronizar esse rito faz diferença na preservação de provas e no controle de responsabilidade.


