Café brasileiro desvia para o Canadá: você paga a conta do tarifaço de 50% nos EUA e alta de 41%?

Café brasileiro desvia para o Canadá: você paga a conta do tarifaço de 50% nos EUA e alta de 41%?

Da lavoura ao porto, a rota do grão mudou. A conta chega ao caixa das cafeterias, às gôndolas e ao bolso do consumidor.

Em menos de três meses, a taxação de 50% sobre o café brasileiro vendida no mercado dos Estados Unidos bagunçou contratos, fretes e estoques. Importadores já deslocam cargas para o Canadá, tentam salvar margens com logística mais longa e empurram aumentos que já se refletem na prateleira.

Tarifa de 50% muda a logística do café nos EUA

A taxa, em vigor desde 6 de agosto, atingiu um elo sensível. O Brasil costuma responder por cerca de um terço do café que abastece o maior consumidor do mundo. Quando o imposto entrou no preço, contêineres ficaram parados, custos explodiram e pedidos foram revistos às pressas.

O impacto se espalhou pela cadeia. Empresas renegociam prazos, trocam fornecedores e realocam rotas. A cada dia parado em porto, crescem despesas com armazenagem e seguro. O efeito chega às torrefações e, por fim, ao varejo.

Tarifa de 50% desde 6 de agosto: cargas travadas, contratos refeitos e pressão imediata sobre os preços no varejo.

Redirecionamento via Canadá vira válvula de escape

Um caso concreto expõe a estratégia emergencial. A importadora Lucatelli Coffee comprou US$ 720 mil em grãos do Brasil já sob as novas regras e decidiu redirecionar o lote para o Canadá, onde não há a cobrança. A empresa mantém a carga num armazém na Flórida, em regime que permite estocar sem recolher impostos, e só embarca para o mercado final quando a conta compensa.

O dono da companhia relata que a conta do frete sobe com o caminho alternativo, mas, diante da alíquota de 50%, o desvio ainda sai menos caro. Se o café entrar nos EUA, a tarifa incide imediatamente. Enquanto isso, a aposta é ganhar tempo e torcer por uma solução diplomática.

Uma carga de US$ 720 mil foi desviada. Vender nos EUA agora significaria pagar 50% de imposto na entrada.

Estoques encolhem e contratos ruem

Torrefações relatam prateleiras de armazém mais vazias e um quebra-cabeça de custos. Algumas conseguiram cancelar parte das compras do Brasil. O cancelamento, porém, veio com multa entre US$ 20 e US$ 25 por saca de 60 quilos, hoje avaliada em torno de US$ 515 sem tarifa. Para cargas já embarcadas, o cancelamento raramente anda.

Cláusulas padrão transferem ao comprador novas tarifas impostas após o fechamento do negócio. O resultado é uma escolha difícil: absorver a alíquota, repassar para o preço final ou caçar substitutos mais caros em outras origens.

  • Cancelar pedidos: evita a tarifa, mas derruba o abastecimento e gera multa por saca.
  • Aceitar a tarifa: eleva custos em contêineres de cerca de US$ 250 mil e aperta as margens.
  • Trocar de origem: reduz a exposição à tarifa, porém paga prêmios maiores por cafés similares.

Preços nas origens se movem em direções opostas

Desde o anúncio da tarifa, em 9 de julho, lotes da Colômbia, do México e da América Central ficaram até 10% mais caros. Já o café brasileiro recuou perto de 5% na origem. No papel, o Brasil parece mais barato; na prática, a tarifa nos EUA elimina essa vantagem e empurra compradores para blends alternativos.

Torrefações testam novas receitas para imitar o perfil sensorial do grão do Brasil. O ajuste leva tempo, mexe no posicionamento de marca e pode exigir mudanças em moagem, torra e proporções de mistura. Nem sempre o resultado satisfaz clientes habituados a determinada xícara.

Consumidor sente a pressão no caixa

Os preços de café torrado e moído nos supermercados americanos subiram 41% em setembro, na comparação anual, segundo dados do governo dos EUA. Parte desse salto vem de safras menores em anos recentes por clima adverso. A tarifa amplia o choque, principalmente nos segmentos populares e no food service.

Varejo em alta: café torrado e moído ficou 41% mais caro em um ano nos EUA, e o repasse tende a continuar.

Nas lojas, clientes migram de marcas para promoções. Há relatos de cafés instantâneos que custavam entre US$ 6 e US$ 7 e agora aparecem a US$ 11, em embalagens que parecem menores. Para cafeterias independentes, a troca de fornecedor nem sempre é opção. Sem volume para negociar, elas absorvem parte da alta ou reduzem margem.

Política, comércio e cálculo de risco

Importadores classificam a medida como punitiva e motivada por política, não por reciprocidade comercial. O entendimento é que o imposto atinge diretamente empresas e consumidores, e não o governo do país exportador. Nesse ambiente, decisões de logística viram apostas: esperar uma negociação entre Washington e Brasília ou bancar rotas mais longas para manter o fluxo.

Fato Número
Alíquota aplicada ao café do Brasil 50%
Participação do Brasil no mercado dos EUA ~33% dos grãos
Alta no varejo (torrado e moído, set/ano) 41%
Multa de cancelamento por saca (60 kg) US$ 20 a US$ 25
Valor de referência por saca (sem tarifa) ~US$ 515
Valor típico de um contêiner ~US$ 250 mil
Carga redirecionada pela Lucatelli Coffee US$ 720 mil
Variação nas origens alternativas até +10%
Variação do café brasileiro na origem ~−5%

Riscos do desvio por terceiros países

O redirecionamento para o Canadá reduz a mordida da tarifa ao entrar naquele mercado. Há, porém, riscos claros. Se o produto reentrar nos Estados Unidos, a cobrança incide. Regras de origem e mecanismos de combate a triangulação podem apertar, caso autoridades entendam que o caminho serve apenas para driblar imposto. Seguradoras e bancos também podem exigir documentação adicional, o que alonga prazos e encarece o capital de giro.

O que muda para exportadores do Brasil

Para tradings e cooperativas brasileiras, o quadro exige ajustes rápidos. Diferenciais de preço já refletem a tentativa de escoar volumes para Europa, Ásia e Canadá. Quem opera com contratos de longo prazo precisa reavaliar cláusulas de tarifas supervenientes e a cobertura no ICE para suavizar oscilações.

  • Revisar Incoterms e responsabilidades em caso de novas tarifas pós-fechamento.
  • Avaliar uso de zonas de comércio com suspensão de impostos para dar flexibilidade logística.
  • Ter planos de contingência para redirecionar lotes sem perder padrão de qualidade e rastreabilidade.
  • Fortalecer comunicação com torrefadores sobre perfis de blend e alternativas para manter consistência sensorial.

Como cafeterias e consumidores podem reagir

Negócios de pequeno e médio porte tendem a sentir antes. Uma saída é renegociar prazos com fornecedores, adotar blends ligeiramente diferentes e ajustar gramaturas sem comprometer a experiência da bebida. Para o cliente final, vale comparar preço por grama, aproveitar ofertas de maior volume e observar a qualidade do lote e a data de torra.

Quando a política encarece o grão, gestão de estoque, negociação e transparência com o cliente viram vantagem competitiva.

Se um acordo comercial aliviar o imposto, o fluxo pode normalizar gradualmente, com reflexos nos preços ao longo de alguns ciclos de compra. Caso contrário, a busca por rotas alternativas e origens substitutas deve seguir. Para o Brasil, o momento desafia a logística e abre chance de consolidar mercados que ganham competitividade quando o câmbio e os prêmios favorecem o grão nacional.

Quem atua no trade também pode simular cenários. Com a alíquota de 50%, um contêiner de US$ 250 mil vira US$ 375 mil na entrada dos EUA. Se o desvio elevar o frete em 15% (US$ 37,5 mil), ainda assim a rota alternativa tende a custar menos do que pagar a tarifa. O cálculo muda com variações de prêmio e câmbio. Por isso, monitorar preços nas origens e no varejo americano, além do ritmo das negociações políticas, ajuda a tomar decisões mais precisas.

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