Uma decisão que parece distante pode mexer no preço do frete, na fila do porto e no emprego de muita gente.
Enquanto Brasília debate regras e prazos, o relógio corre para o Tecon 10, megaterminal de contêineres que promete redesenhar a logística do Porto de Santos e mexer no bolso de exportadores, importadores e consumidores.
O que está em jogo
O leilão do Tecon 10, previsto inicialmente para dezembro, já enfrenta forte pressão para migrar para o início de 2026. A razão central está na demora do Tribunal de Contas da União em concluir a análise das regras propostas pela Antaq. Sem esse aval, não há segurança jurídica para bater o martelo ainda em 2025.
O megaterminal ocupa área de 622 mil m² e carrega metas ambiciosas: aumentar em 50% a capacidade do Porto de Santos, chegar a 3,5 milhões de TEUs por ano e erguer quatro novos berços de atracação, além de um terminal de passageiros. O plano de negócios prevê outorga estimada em R$ 6,5 bilhões e investimentos que podem alcançar R$ 40 bilhões ao longo de 25 anos.
Sem a definição do TCU, o leilão de 2025 fica por um fio e cresce a chance de estreia no início de 2026.
As regras que travam a disputa
A Antaq desenhou um modelo em duas fases. Na primeira, somente empresas que não operam terminais de contêineres em Santos poderiam disputar. A ideia busca reduzir concentração e estimular novos entrantes. Se ninguém aparecer, a segunda fase abriria espaço para os atuais operadores.
Dois pareceres técnicos sugerem abordagem distinta: leilão em fase única, com a presença de todos desde o início, condicionado a compromissos de desinvestimento caso um incumbente vença. A Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda e a unidade especializada do TCU em portos e ferrovias convergiram nessa direção.
O Cade identificou riscos concorrenciais na concessão a grupos que já atuam no porto, mas indicou necessidade de exame mais aprofundado para cravar uma conclusão. Em paralelo, a procuradoria do Ministério Público junto ao TCU defendeu que restringir a participação dos atuais operadores de contêineres em Santos é ilegal e deve ser corrigido.
| Órgão | Papel no processo | Ponto atual |
|---|---|---|
| Antaq | Propõe o modelo de leilão e o edital | Defende duas fases com foco em novos entrantes |
| TCU | Controle e análise de legalidade e economicidade | Avaliação em curso, com risco de pedido de vista |
| Seae (Fazenda) | Concorrência e política econômica | Sugere fase única com desinvestimentos condicionados |
| Cade | Defesa da concorrência | Sinaliza risco, pede exame de concentração mais profundo |
| MP junto ao TCU | Controle externo e pareceres | Considera ilegal restringir os incumbentes |
| Ministério de Portos | Política e cronograma | Diz trabalhar para 2025, mas depende do TCU |
O projeto em números
- Área: 622 mil m² no Porto de Santos.
- Capacidade: até 3,5 milhões de TEUs por ano.
- Infraestrutura: quatro berços de atracação e terminal de passageiros.
- Outorga: previsão de arrecadação de R$ 6,5 bilhões.
- Investimentos: até R$ 40 bilhões ao longo de 25 anos.
- Objetivo: ampliar em 50% a capacidade de contêineres do porto.
Mais capacidade significa menos filas, maior previsibilidade para quem exporta e potencial de reduzir custos logísticos.
Quem pode entrar na briga
O desenho original, se mantido, dá tração para operadores globais que ainda não comandam terminais de contêineres em Santos. A lista de interessados inclui nomes com escala mundial, fôlego financeiro e histórico de execução em infraestrutura.
- Cosco (China) — braço de logística de uma das maiores frotas do planeta, com presença em mais de 160 países. A companhia vem ampliando ativos na América do Sul, o que tende a garantir volumes e escala para viabilizar o terminal.
- ICTSI (Filipinas) — operador independente com atuação no Brasil. Mostra capacidade regulatória e entrega de investimentos, ponto sensível em concessões de grande porte.
- PSA International (Singapura) — referência global em transbordo e cadeia de suprimentos, com dezenas de terminais. Experiência operacional amplia a chance de cumprimento contratual no prazo.
- ONE (Ocean Network Express) — armador com frota superior a 260 navios e presença em mais de 100 países. Pode casar frota e terminal para garantir volumes mínimos desde o início.
- Hutchison Ports (Hong Kong) — operador de terminais com ênfase em governança e compliance, perfil aderente a exigências ambientais e de transparência.
Uma advogada especializada em licitações do setor aponta que esses grupos, em geral, combinam histórico de grandes contratos, caixa para cumprir cronogramas e menor risco de concentração no mercado doméstico, ponto sensível para o Cade.
Cronograma e incertezas
O caso tem relatoria no TCU e um prazo indicativo para chegar ao plenário. Mesmo com aceleração, a agenda de sessões até o fim do ano é apertada. Um pedido de vista, recurso comum em processos complexos, empurra a votação. Fontes do setor já trabalham com a janela do primeiro trimestre de 2026 para a disputa, caso a Corte não conclua a análise em 2025.
O Ministério de Portos afirma que quer leiloar o Tecon 10 ainda este ano, mas essa meta depende do crivo do TCU e da estabilidade do edital. Sem acordo regulatório, o risco de judicialização aumenta e pode travar a assinatura do contrato depois do leilão.
Por que o atraso mexe com você
O Porto de Santos é a porta de entrada e saída de produtos que chegam à sua mesa e à sua empresa. Sem nova capacidade, navios aguardam mais, a cadeia atrasa e o custo do frete pressiona preços. Caminhoneiros, trabalhadores portuários e operadores logísticos sentem o efeito em jornadas imprevisíveis e contratos mais curtos.
Com o Tecon 10 implantado, há espaço para reduzir tempo de espera, ganhar janelas de atracação e ampliar previsibilidade. Sem o terminal, importadores correm o risco de pagar mais por armazenagem e demurrage. Exportadores perdem fôlego em janelas de safra, quando cada hora no cais conta.
O que o debate regulatório pode mudar
O modelo de duas fases favorece a entrada de novos players, com menor risco de concentração e potencial de disputa mais equilibrada. A fase única, com obrigação de desinvestimento para incumbentes vencedores, amplia o leque de interessados e pode aumentar a competição no lance, mas exige monitoramento posterior para garantir que o desinvestimento saia do papel.
Para o financiador, previsibilidade é chave. Edital estável, regras claras e um cronograma exequível reduzem risco e barateiam capital. Para o Estado, a meta é combinar arrecadação de outorga com investimentos efetivos em prazo razoável, para que a capacidade chegue antes do próximo pico de demanda.
Glossário e pistas para acompanhar em 2025
- TEU: medida padrão de contêiner de 20 pés. A meta de 3,5 milhões de TEUs por ano dá a escala do terminal.
- Pedido de vista: mecanismo que prolonga a análise no TCU e pode empurrar o cronograma.
- Desinvestimento: obrigação de vender ativos ou reduzir participação para mitigar concentração após um leilão.
Se o TCU optar por ajustes no edital, acompanhe três sinais: interesse declarado de grupos sem operações em Santos, posição do Cade diante de eventuais compromissos de desinvestimento e a data de publicação da versão final do edital. Esses marcos definem se você verá leilão competitivo e obra começando no curto prazo ou um novo ciclo de debates no papel.


