Moradores de Araguaína relatam atrasos e promessas vazias enquanto promotores e policiais avançam sobre suspeitas que atingem a fila do SUS.
Sete mandados de busca e apreensão foram cumpridos nesta terça-feira (4) em Araguaína. O Gaeco do MP-TO, com apoio da Polícia Civil, apura um esquema de “fura-fila”, venda de cirurgias e favorecimento político no Hospital Regional de Araguaína. A investigação começou em 2022, após uma denúncia anônima.
O que se sabe até agora
As diligências miraram endereços de servidores e de pessoas ligadas ao hospital. O objetivo foi recolher documentos, celulares e registros financeiros capazes de comprovar cobranças indevidas e manipulação de vagas. O foco está em cirurgias, internações e até em resultados de biópsias que teriam sido mercantilizados.
O Ministério Público descreve um grupo com divisão de tarefas e objetivo de obter ganhos econômicos e capital político. O comando seria exercido por um ocupante da alta direção do hospital, apontado como articulador de mudanças na regulação para atender pedidos e pressionar equipes.
Venda de procedimentos, manobras na fila e uso político de serviços públicos de saúde estão no centro da apuração.
A Secretaria de Estado da Saúde afirma que não houve buscas nas dependências do hospital e que não foi formalmente notificada da operação. A pasta diz repudiar condutas que violem a lei e sinaliza disposição para colaborar quando acionada.
Como o esquema operava, segundo a investigação
As apurações indicam que o grupo atuava preferencialmente à noite e em fins de semana, quando o controle é mais frágil e o volume de supervisão cai. Pacientes indicados por intermediários ou por interesses políticos teriam sido priorizados em detrimento de quem aguardava na lista regular.
- Cobrança por “atalhos” em cirurgias e por liberação de resultados de biópsia.
- Manipulação de internações e encaixes para alterar a ordem de atendimento.
- Uso da estrutura para favorecer cabos eleitorais, com relatos de coação a terceirizados.
- Orientação a pacientes para recusar alta com promessa de cirurgia mais rápida mediante pagamento.
Há menção à participação de servidores e de um ex-funcionário, exonerado, que continuaria frequentando o hospital para captar interessados em consultas e procedimentos sob demanda.
Interceptações telefônicas, depoimentos e quebras de sigilo bancário e fiscal compõem o conjunto de provas reunido pelo Gaeco.
Auditorias financeiras encontraram movimentações incompatíveis com salários. Em um caso, um PIX para parente de investigado teria sido vinculado a um procedimento “facilitado”. O nome do principal investigado não foi divulgado; a defesa não foi localizada.
A operação em números e marcos
| Data | Ação | Órgão |
|---|---|---|
| Maio de 2022 | Chegada de denúncia anônima e abertura do procedimento | MP-TO (Gaeco) |
| 2022–2025 | Depoimentos, interceptações e quebras de sigilo autorizadas | Judiciário, MP-TO |
| 4 de novembro de 2025 | Sete mandados de busca e apreensão em Araguaína | Gaeco e Polícia Civil |
O que diz o governo do Tocantins
A Secretaria de Saúde informa que não houve cumprimento de mandados dentro do Hospital Regional de Araguaína nem em outras unidades estaduais. Alega não ter sido notificada e reforça que repudia práticas ilegais. A gestão afirma que se colocará à disposição da Justiça para esclarecer fatos e adotar medidas cabíveis quando formalmente demandada.
Serviço público de saúde é gratuito. Qualquer pedido de dinheiro por atendimento no SUS configura crime e deve ser denunciado.
Impacto para quem depende do SUS
Quando alguém paga para atravessar a fila, o efeito recai sobre quem aguardou meses por uma cirurgia marcada. Vagas escassas e equipes limitadas tornam a regulação sensível a desvios. A confiança no sistema sofre, e o atraso gera agravamento de quadros clínicos.
Fraudes também ferem a isonomia. O SUS prioriza casos por critérios médicos, não por influência. A manipulação da fila desmonta esse princípio e espalha insegurança entre pacientes e profissionais que atuam corretamente.
Como agir diante de cobranças indevidas
- Guarde nomes, horários, mensagens, comprovantes e qualquer pagamento (inclusive PIX) que tenham sido solicitados.
- Registre a ocorrência na delegacia e protocole denúncia na Ouvidoria do SUS (telefone 136) e no Ministério Público local.
- Procure a Defensoria Pública para orientação jurídica gratuita e apoio na formalização do caso.
- Peça laudos e relatórios médicos. Documentos clínicos ajudam a mostrar a urgência e a necessidade do procedimento.
Aspectos legais em jogo
Condutas narradas pelo MP podem se enquadrar em corrupção passiva e ativa (previstas no Código Penal), além de atos de improbidade administrativa. Quando há atuação coordenada, a lei de organizações criminosas também pode ser considerada. As penas variam conforme a participação e a comprovação dos fatos, e qualquer responsabilização depende de decisão judicial.
Além de processos criminais, servidores e gestores podem enfrentar sanções cíveis e administrativas, como perda da função pública, suspensão de direitos políticos e multa. Pacientes lesados têm direito de buscar reparação.
Como a fila do SUS deveria funcionar
Hospitais regulam vagas com base em protocolos clínicos. Cirurgias seguem critérios de risco, tempo de espera e disponibilidade de equipe e leitos. O pedido político não cria prioridade. Para cirurgias eletivas, a regulação organiza a lista; urgências entram por portas de entrada, como pronto-socorros, com avaliação médica.
Transparência ajuda a reduzir brechas. Painéis públicos com tempo médio de espera, auditorias periódicas e fiscalização de rotinas em plantões noturnos e de fins de semana tendem a diminuir o espaço para desvios.
O que observar nos próximos dias
- Possíveis afastamentos cautelares de servidores e dirigentes.
- Novas quebras de sigilo e perícias em dispositivos apreendidos.
- Pedidos do MP à Justiça para preservar provas e evitar interferências.
- Medidas de integridade na regulação e em contratos com terceirizados.
Informações práticas para o paciente
Se você aguarda cirurgia no HRA, peça o número de protocolo e atualize contatos com a regulação municipal ou estadual. Mantenha cópias de exames e relatórios. Em caso de piora clínica, procure uma unidade de urgência e leve a documentação. Confirme a posição na fila quando disponível e desconfie de intermediários prometendo facilidades.
Grupos comunitários e conselhos municipais de saúde podem acompanhar casos e cobrar transparência. Reuniões abertas, com atas, trazem controle social e servem de canal para relatos que ajudem a prevenir novas irregularidades.


