Réu da PF vira secretário da Justiça em São Bernardo: você aceita pagar R$ 30 mil por mês?

Réu da PF vira secretário da Justiça em São Bernardo: você aceita pagar R$ 30 mil por mês?

Movimentos silenciosos no Paço Municipal reacenderam dúvidas, mexeram com a folha de pagamentos e trouxeram velhos nomes de volta.

Em meio a uma reforma ampla do primeiro escalão, o prefeito Marcelo Lima reorganizou núcleos-chave da administração e escolheu o advogado Carlos Roberto Maciel para comandar a Secretaria da Justiça. Maciel é réu na Operação Prato Feito, da Polícia Federal, e volta ao centro do poder local após ter deixado cargos públicos em 2018. A prefeitura afirma que ele não tem condenações e ressalta sua experiência técnica. O filho do novo secretário também foi nomeado para cargo comissionado no gabinete do prefeito.

Quem é Carlos Roberto Maciel

Advogado há mais de quatro décadas, Carlos Roberto Maciel ocupou no passado pastas estratégicas em São Bernardo e presidiu a Fundação ABC. Ele deixou essas funções quando veio à tona a investigação que apura desvios em contratos de alimentação escolar em municípios paulistas.

Agora, assume a Secretaria da Justiça no lugar de Ronaldo Alves Vitale Perrucci, com remuneração mensal de R$ 30.168,57. O Diário Oficial registra ainda a nomeação do filho de Maciel, Carlos Eduardo Maciel Reps, como assessor no gabinete do prefeito.

Réu na Operação Prato Feito, Maciel assume a Justiça municipal com salário de R$ 30.168,57 e sem condenações judiciais.

Segundo a administração municipal, a escolha teve caráter técnico e recaiu sobre alguém que já conhece o funcionamento interno da máquina. A prefeitura não comentou a nomeação do filho do secretário.

O que está em discussão no caso

Maciel responde a processo no qual o Ministério Público aponta facilitação de contrato da empresa Le Garçon, ligada à época ao seu então genro, com prefeituras paulistas, entre elas Itaquaquecetuba. O relatório da PF atribui ao ex-parente o papel de liderança no grupo investigado e descreve pagamentos ilícitos a agentes públicos. Duas filhas do secretário também figuram como rés.

O processo mudou de instância em 2024: saiu da Justiça Federal e foi remetido à Justiça Eleitoral, após entendimento de conexão com crimes eleitorais. A Procuradoria Regional Eleitoral pediu o retorno ao TRF-3, por não vislumbrar crime eleitoral nessa parte do caso. Uma juíza do TRE-SP analisa o pedido. Enquanto isso, os réus permanecem nessa condição e podem apresentar defesas.

O que foi a Operação Prato Feito

Deflagrada para desarticular fraudes em contratos de merenda e limpeza, a operação apontou um volume financeiro que supera R$ 1,6 bilhão em todo o estado, com 85 alvos entre prefeitos, ex-prefeitos, servidores e empresários. As investigações indicam combinação de licitações, propina e renovação de contratos sem critério técnico.

O caso segue sem sentença. Há presunção de inocência, mas o risco reputacional para o governo municipal é imediato.

Reforma no primeiro escalão

Após decisão judicial que o reconduziu ao cargo em 10 de outubro, Marcelo Lima promoveu trocas em várias pastas. Parte dos substituídos integrava o desenho anterior de governo. Veja quem saiu e quem entrou:

Pasta Quem saiu Quem entrou
Comunicação Márcio Madureira Renato Targino
Serviços urbanos Fernando Longo Luiz Bortoletto
Planejamento urbano Geslei Bonício Crociari Milena Graciano
Defesa civil Coronel Ronaldo Faro Marcos Cayres
Meio ambiente Ruth Ramos Joyce Quintino
Habitação Frida Waidergorn Ruth Ramos
Justiça Ronaldo A. V. Perrucci Carlos Roberto Maciel

O que diz a prefeitura

Em nota, a gestão municipal sustenta que Maciel tem “vasta experiência técnica e política” e histórico de atuação em diferentes áreas do Executivo local. Argumenta que cargos de secretários são de livre nomeação e que o escolhido não possui condenação que o impeça de exercer funções públicas. A administração confirmou o salário de R$ 30.168,57 para a pasta da Justiça e não respondeu sobre o cargo do filho do secretário.

Nepotismo e linha tênue do cargo político

A nomeação do filho de um secretário para função comissionada costuma gerar questionamentos sobre nepotismo. A Súmula Vinculante 13 do STF veda a contratação de parentes até o terceiro grau em cargos de confiança. Há decisões que diferenciam cargos políticos, como secretarias, de posições técnicas. Ainda assim, quando o parente ocupa posto comissionado na mesma estrutura de governo, o Ministério Público costuma analisar eventual subordinação e possíveis trocas de favores, o chamado nepotismo cruzado.

Para o cidadão, a pergunta é direta: há transparência suficiente sobre as atribuições, qualificação e metas do novo assessor? Sem isso, crescem as chances de judicialização e de desgaste político.

O que faz a Secretaria da Justiça

Em municípios de grande porte, a secretaria tem papel de coordenação jurídica, articulação com o contencioso, assessoramento normativo e integração com controladoria e procuradoria. Também atua na elaboração de decretos, revisão de contratos e desenho de medidas de integridade. Com um réu à frente, a pasta ganha visibilidade e passa a ter sua atuação examinada com lupa, principalmente quando toca temas de contratação pública e compliance.

Impactos práticos para o contribuinte

Nomeações em áreas sensíveis repercutem no caixa, na eficiência e na confiança na administração. Quando há processos em curso, a percepção de risco pode afetar a relação com fornecedores e a execução de contratos. Órgãos de controle também tendem a intensificar auditorias, o que exige estrutura preparada para responder a ofícios e corrigir rotas.

  • Risco: suspensão de contratos e atrasos por medidas cautelares judiciais.
  • Oportunidade: revisão de processos e implantação de políticas de integridade.
  • Custo: aumento de demandas jurídicas e de governança.
  • Benefício potencial: padronização de editais e redução de litígios, se metas forem cumpridas.

O que observar daqui para frente

A sequência do caso judicial definirá onde o processo tramitará (Justiça Eleitoral ou Federal) e o ritmo das audiências. Enquanto isso, a gestão precisa apresentar resultados concretos. Três sinais ajudam o morador a avaliar o desempenho da nova cúpula:

  • Publicação de um plano de integridade com prazos, responsáveis e metas mensuráveis.
  • Divulgação de relatórios trimestrais de contratos de alto valor, com indicadores de economia e qualidade.
  • Criação de canal para denúncias com garantia de anonimato e prestação de contas dos encaminhamentos.
  • Sem transparência ativa e metas públicas, a nomeação tende a aumentar a pressão de órgãos de controle e da sociedade.

    Como o cidadão pode acompanhar

    É possível monitorar diários oficiais, portais de contratação e sessões da Câmara Municipal. Solicitações de informação via lei de acesso permitem obter cópias de contratos, relatórios e pareceres. Em caso de indícios de irregularidade, denúncias podem ser encaminhadas ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas estadual. Reuniões de conselhos municipais também funcionam como espaço de cobrança.

    Para contextualizar valores, o salário do secretário representa cerca de um teto para cargos de livre provimento em nível municipal. A comparação com entregas efetivas — redução de litígios, acordos bem-sucedidos, melhora na qualidade dos contratos — ajuda a medir se o custo compensa. Uma meta razoável é que economias produzidas pela atuação jurídica superem a folha da pasta ao longo do ano.

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