Você acha que o Canastra é o mais antigo? dados de 1700 revelam o Serro e mudam seu prato hoje

Você acha que o Canastra é o mais antigo? dados de 1700 revelam o Serro e mudam seu prato hoje

Entre serras, garimpo e fogões de lenha, tradições moldaram sabores que você leva à mesa sem perceber, todos os dias.

No coração de Minas, uma receita mais antiga do que o Canastra fermentou silenciosa por séculos. O queijo do Serro nasceu no século XVIII, atravessou crises do ouro e ganhou posto de referência entre as iguarias brasileiras. A história mexe com memória afetiva, economia rural e o que chega ao seu café da manhã.

Onde o ouro virou leite

O enredo começa na antiga Vila do Príncipe, hoje Serro, quando o ciclo do ouro levou gado, gente e saberes às montanhas. Os colonos portugueses trouxeram referências da Serra da Estrela. O relevo mineiro, o clima serrano e o manejo do pasto mudaram a lógica do preparo. As famílias passaram a usar leite cru e “pingo”, o fermento natural colhido da produção do dia anterior. Surgiu um queijo úmido, branco, de acidez delicada e frescor que pede menos cura.

O queijo do Serro antecede o Canastra e inaugura a rota queijeira de Minas no século XVIII, unindo garimpo, roça e mesa.

Receita que atravessou o Atlântico

Inspirado no modelo lusitano, o Serro ganhou sotaque mineiro. As queijeiras moldaram discos menores, deixaram a massa menos prensada e optaram por salga seca. A cura acontece em tábuas de madeira, com fluxo de ar e vigilância diária. O resultado entrega maciez e notas lácticas limpas. Na quitanda da cidade, o ponto ideal varia entre sete e quatorze dias. Para circular em mercados mais distantes, muitos produtores estendem a cura para além de duas semanas.

Serro versus Canastra: diferenças que contam

Os dois pertencem à família do Queijo Minas Artesanal, mas seguem caminhos distintos. A comparação ajuda quem compra e quem serve.

  • Textura: Serro tende a ser mais úmido e macio; Canastra, mais firme e com casca espessa.
  • Sabor: Serro é suave, com leve acidez; Canastra traz notas animais e final mais persistente.
  • Cura: Serro pede menos dias; Canastra valoriza maturação mais longa.
  • Uso: Serro funciona no pão quente e em saladas; Canastra brilha em tábuas e gratinados.
Aspecto Queijo do Serro Queijo Canastra
Origem histórica Vila do Príncipe (Serro), século XVIII Região da Serra da Canastra, posterior
Umidade Alta a média Média a baixa
Casca Fina, clara Mais grossa, amarelada
Tempo típico de cura 7 a 14 dias no consumo local 14 a 30 dias, com ganhos na maturação
Perfil de sabor Láctico, fresco, ácido sutil Marcante, evolui para notas de manteiga e nozes

Reconhecimento e proteção

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) registrou, em 2008, o “Modo Artesanal de Fazer Queijo de Minas” como Patrimônio Cultural Imaterial, contemplando as regiões do Serro, da Canastra e do Salitre. O registro valoriza o uso de leite cru, o pingo e a cura em condições tradicionais. Órgãos como IMA e MAPA criaram regras para garantir segurança sem apagar o saber fazer.

Selos e certificações ajudam o consumidor. O Selo Arte permite venda interestadual de produtos artesanais que cumpram boas práticas. As Indicações Geográficas, concedidas pelo INPI, protegem nomes de origem e incentivam qualidade e rastreabilidade. Ao escolher um Serro com selo, você financia a permanência da atividade no campo.

Patrimônio imaterial não é vitrine: é renda, território e futuro para famílias que vivem do queijo de leite cru.

O papel das mulheres nas queijarias

Nomes de mãe e avó sustentam a técnica. Elas conduzem o ponto da massa pelo tato, controlam a acidez pelo cheiro e regulam a cura com o olhar. Em muitas fazendas, a sucessão familiar preserva cadernos de anotações e fermentos com décadas de vida. Sem esse trabalho contínuo, a receita teria se perdido.

Como comprar, guardar e servir

O Serro pede atenção na escolha. O frescor é aliado, mas exige cuidados na geladeira e na mesa.

  • Observe a casca: deve estar íntegra, sem rachaduras profundas ou bolores escuros.
  • Aperte com delicadeza: o miolo cede levemente e volta; excesso de água indica ponto imaturo.
  • Prefira embalagens que permitam respirar; filme muito apertado sufoca o queijo.
  • Guarde entre 5 °C e 8 °C; retire 30 minutos antes de servir para soltar aromas.
  • Harmonize com café passado na hora, goiabada cremosa ou cachaça de alambique.

Economia, turismo e novos mercados

O Serro estrutura rotas de visitação, com fazendas abertas na época de seca e festas gastronômicas em praças históricas. A cadeia movimenta leiterias, pequenos atacarejos e restaurantes regionais. Em prateleiras de capitais, o Canastra costuma aparecer primeiro. O Serro cresce com pontes comerciais, participação em feiras e premiações que validam seu estilo mais fresco.

Exportações ainda representam fração pequena. Exigências sanitárias e logística de frio encarecem envios. Cooperativas buscam padronizar processos sem apagar a identidade. Para o consumidor, isso significa mais variedade e transparência sobre origem, datas de fabricação e lote.

Riscos e cuidados sanitários

Queijo de leite cru pede controle rigoroso. Produtores usam água tratada, ordenha limpa e pingo mantido em condições seguras. A maturação mínima varia conforme a norma aplicável e o destino da venda. Procure rótulos com número do produtor, registro no serviço de inspeção e, quando houver, Selo Arte. Em viagens, transporte o queijo refrigerado ou em bolsas térmicas com gelo reutilizável.

Na sua cozinha, sem complicação

O Serro funciona além da tábua. A umidade favorece preparo rápido e calor moderado. Em fogo alto, ele pode soltar soro em excesso. Ajuste a técnica e acerte o ponto.

  • Farofa de Serro: toste farinha de milho com manteiga, junte cubos de queijo e finalize com cheiro-verde.
  • Omelete: rale fino, bata com ovos e uma colher de pingo ou iogurte; fogo baixo, tampa fechada.
  • Salada morna: tomates assados, rúcula, azeite e lâminas de Serro no final, sem levar ao forno.

Perguntas que valem na hora da compra

  • Qual a data de fabricação e o ponto de cura recomendado pelo produtor?
  • O lote usa pingo próprio? Há rastreabilidade do leite?
  • O queijo possui inspeção (municipal, estadual ou federal) e Selo Arte?

Para ampliar o repertório

Quem gosta de história pode comparar técnicas do Serro com as do queijo Serra da Estrela. O contraste entre coalho e flor de cardo, entre clima úmido luso e seca mineira, mostra como terroir muda textura e acidez. Vale montar uma degustação cega com quatro pontos de cura do Serro. Anote sensação tátil, aroma, sal e doçura. Essa prática treina o paladar e ajuda na compra consciente.

Outra frente é a economia doméstica. O Serro rende em preparos de alto impacto e baixo custo, como pão de minuto e torta de frigideira. O consumo responsável evita desperdício. Rale as aparas e congele em porções pequenas. Use em caldos, pirões e massas rápidas. Você aproveita tudo e mantém a tradição viva dentro de casa.

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