Cores no prato, histórias de superação e um corredor inteiro em movimento. A hora da comida mudou o humor e a rotina.
No Hospital Regional Dr. Abelardo Santos, em Belém, a alimentação infantil virou uma experiência que mistura terapia e brincadeira. A equipe decidiu transformar o visual das refeições. O objetivo é simples e direto: fazer a criança voltar a comer, ganhar energia e recuperar forças com menos resistência.
Quando o prato vira convite
Evelly, oito anos, chegou sem apetite. A mãe insistia, e o garfo não saía do lugar. A equipe de Nutrição entendeu o sinal. Em vez de repetir o cardápio formal, trouxe flores feitas com legumes, bichinhos de ovo e frutas em mosaico. A menina reagiu na primeira bandeja. Comeu, sorriu e pediu mais. O jantar deixou de ser um conflito. Passou a ser um momento de curiosidade.
João Pedro, também com oito anos, enfrentou uma parada brusca no apetite após um acidente. No Dia das Crianças, recebeu panquecas coloridas. Ele experimentou sem medo. A cor chamou antes do cheiro. E o prato veio limpo. O desenho divertido não substitui a nutrição. Ele abre caminho para ela.
Pratos coloridos elevam a adesão, melhoram a aceitação e encurtam o tempo até a recuperação nutricional adequada.
O que está por trás do prato lúdico
O Serviço de Nutrição e Dietética organiza a produção com mais de 80 profissionais. Copeiros, cozinheiros, auxiliares e nutricionistas trabalham em sequência. A cozinha monta combinações com grãos, proteínas, legumes e frutas. A apresentação vem por último, como um acabamento terapêutico. O desenho muda, mas os valores nutricionais ficam fiéis ao plano do paciente.
A equipe evita exageros. O formato chama o olhar, sem disfarçar texturas e porções. A criança enxerga a cenoura. Sente o feijão. Reconhece o ovo. Isso reduz o estranhamento e previne recusas no dia seguinte.
Como a criatividade vira cuidado
- Verduras viram flores com cortes simples e seguros.
- Ovos cozidos formam bonecos com olhos de azeitona.
- Frutas compõem bichinhos, estrelas e corações sem açúcar extra.
- Panquecas ganham tons naturais com beterraba, espinafre e cenoura.
- Arroz, feijão e proteínas mantêm porção e valor calórico prescritos.
Forma lúdica não é fantasia: é estratégia de cuidado para reduzir medo, insegurança e tristeza durante a internação.
Por que as crianças param de comer no hospital
Medicação muda o paladar. A rotina hospitalar quebra horários. A dor tira a vontade de mastigar. O estresse aumenta a sensibilidade a cheiros. Tudo isso reduz a adesão à dieta. Em adultos, a lógica costuma seguir a razão. Em crianças, o afeto funciona melhor. O prato que conversa com o lúdico ativa memória positiva. E a refeição volta a caber no dia.
Nutricionistas relatam melhora clara quando a equipe apresenta o alimento como brincadeira séria. O cuidado ganha cara amiga. As crianças reagem com menos resistência. Pais relaxam. O quarto fica mais leve.
Impactos clínicos observados
| Desafio | Solução aplicada | Efeito esperado |
|---|---|---|
| Baixo apetite | Apresentação lúdica e cores naturais | Aumento da ingestão calórica e proteica |
| Estranhamento ao cardápio | Formatos familiares e porções menores | Maior aceitação e menos sobras |
| Ansiedade e medo | Ritual de entrega no leito com acolhimento | Melhor humor e cooperação no tratamento |
| Alteração de paladar | Variedade de texturas e temperos suaves | Adaptação gradual sem aversões |
O papel do HRAS na rede pediátrica
O Hospital Abelardo Santos é a maior unidade pública do Pará. A instituição mantém urgência e emergência pediátrica 24 horas. O atendimento cobre quatro frentes: pronto-socorro, cirurgia, internação clínica e UTI. A unidade também acolhe nas Unidades de Cuidados Intermediários. A gestão é do Instituto Social Mais Saúde, em parceria com a Sespa. O foco recai no cuidado centrado no paciente. A segurança orienta cada etapa.
Mais de 80 profissionais levam as refeições até o leito e reforçam o vínculo entre cozinha, criança e recuperação.
O que pais e responsáveis podem adaptar em casa
Rotina e visual conversam com a fome infantil. Em casa, a família pode reproduzir ideias simples, sem custo alto e sem corantes artificiais. O segredo está na constância e na segurança do preparo.
Três passos práticos para o prato brincar com a criança
- Defina um tema por dia, como jardim, fazenda ou mar, para organizar cortes e cores.
- Use moldes simples de biscoito para frutas macias e legumes cozidos.
- Monte o prato junto com a criança, dando pequenas escolhas de cor e formato.
Ideias com ingredientes do dia a dia
- Arroz em “montanha” com feijão em “trilha” e cenoura em “sol”.
- Omelete recheada cortada em estrelas, com espinafre picado para cor.
- Iogurte natural com frutas em “tabuleiro”, sem açúcar extra.
Alguns cuidados reduzem riscos. Evite peças muito pequenas para crianças menores, como uvas inteiras. Corte em quatro e retire sementes. Atenção a alergias relatadas. Não use palitos pontiagudos na montagem do prato. Prefira unir peças com purês firmes. Mantenha a higiene desde a pia até a tábua de corte.
O que a ciência aponta sobre o apelo visual
Estudos em nutrição pediátrica mostram que apresentação colorida aumenta a tentativa de primeira mordida. Crianças respondem melhor a variedade de cores e formatos claros. A mistura visual não deve confundir. Separar itens no prato ajuda a identificar sabores. Repetição com pequenas variações consolida hábitos. O impacto cresce quando a família repete o ritual nos mesmos horários.
No hospital, a estratégia complementa o plano nutricional. Ela não substitui a conduta clínica. Médicos e nutricionistas ajustam porções, texturas e restrições. A brincadeira dá o empurrão psicológico que faltava. O corpo aproveita quando a cabeça aceita.
Dentro da cozinha: fluxo que gera confiança
O preparo começa cedo. A equipe checa prescrições e restrições. Cozinheiros executam técnicas suaves, com cortes padronizados e tempo de cocção controlado. Nutricionistas conferem pesagem e composição. Na etapa final, a equipe monta os desenhos. Os copeiros assumem a bandeja e seguem até o leito. Eles observam reações e informam a equipe. Esse retorno alimenta ajustes no dia seguinte.
O resultado aparece no rosto da criança e nos números do prato. A sobra diminui. O tempo de refeição encurta. O humor melhora antes da medicação fazer efeito. O quarto fica menos tenso. A família coopera. O tratamento segue com menos interrupções.
Para quem quer dar o próximo passo
Vale experimentar um “calendário de cores” em casa por sete dias. Segunda com tons laranja. Terça em verde. Quarta com roxos e vermelhos. Essa rotina ajuda a variar nutrientes. A brincadeira dá assunto para a mesa. O adulto ganha chance de apresentar sabores novos sem conflito.
Outra ideia é um quadro simples de metas. A criança marca com adesivos quando prova algo novo. A regra é clara. Uma mordida vale. Sem pressão por prato limpo. O reforço positivo funciona melhor. O hábito sai da teoria e entra no garfo.


