Arquitetos explicam por que as casas antigas do Sul resistem melhor ao calor

Arquitetos explicam por que as casas antigas do Sul resistem melhor ao calor

O calor no Sul já não é aquele de antigamente. Enquanto cidades batem recordes e o asfalto parece vibrar ao meio-dia, há casas antigas que seguem frescas, quase teimosas, como se carregassem um segredo no forro. Arquitetos apontam para soluções simples, bem pensadas, desenhadas quando ar-condicionado nem passava pela cabeça. E a pergunta fica no ar: por que funcionam tão bem?

No fim da tarde, a rua de paralelepípedo em Pelotas ferve sob um sol branco, mas o interior da casa de 1928 cheira a madeira e brisa. As venezianas deixam a luz entrar filtrada, o piso frio de ladrilho português acalma o passo, e a sala parece dois graus abaixo do quintal. O ventilador de teto ronrona no ritmo da maresia, e a sombra do beiral desenha uma borda larga no chão. A sensação é de respiro, não de clausura. O segredo não é novo.

O que as casas antigas sabem sobre o calor

Casas antigas do Sul foram erguidas para conviver com o clima, não para vencê-lo. Pé-direito alto, paredes espessas, janelas em duas fachadas e beirais generosos criam um circuito de ar que entra, cruza e sai. Nada de selar a casa como um pote. A sombra é parte do projeto, assim como o porão ventilado e o telhado com cumeeira alta. É arquitetura que conversa com o vento e respeita o sol.

Em Curitiba, uma moradora mediu com um termômetro simples: lado de fora a 36 ºC; dentro da casa de 1935, 29 ºC, sem ar-condicionado. A diferença veio da ventilação cruzada e de um corredor que funciona como “chaminé térmica”. Todo mundo já viveu aquele momento em que o ar parado pesa na sala. Nessas casas, o ar se mexe porque as aberturas foram desenhadas para isso, não por acaso ou modismo.

O mecanismo é lógico. Paredes de tijolo maciço e pedra têm inércia térmica, retardam o calor e liberam lentamente o frescor da noite. Telha cerâmica sobre forro de madeira cria uma câmara de ar que dissipa o quente antes que chegue aos quartos. Janelas altas expulsam o ar aquecido por diferença de densidade, enquanto beirais e varandas protegem as fachadas do sol direto da tarde. A soma rende conforto com gasto energético mínimo.

Como trazer essas soluções para hoje

Comece pelo mapa do vento e do sol da sua casa. Abra portas opostas e teste qual combinação gera correnteza, usando uma fita de papel para ver a direção do ar. Crie exaustão térmica: basculantes ou vitrôs altos no corredor ajudam o ar quente a subir e sair. De manhã cedo e à noite, ventile generosamente; nas horas de sol forte, feche persianas e mantenha a sombra nos ambientes expostos ao oeste. Funciona melhor do que parece.

Erros comuns derrubam o conforto. Cortinas pesadas até o chão bloqueiam a brisa; prefira tecidos leves e venezianas de madeira. O rejunte cedeu no forro? Pequenas frestas viram entradas de calor no verão. Plante sombra no lugar certo: árvores caducas a oeste e noroeste protegem no verão e deixam o sol de inverno entrar. Sejamos honestos: quase ninguém faz isso todo dia. Crie rotinas simples, como “abrir às 7h, fechar às 11h”, e a casa começa a colaborar.

Um único reparo bem-feito no beiral pode valer mais que um aparelho novo.

“Essas casas não são frias por acaso. Elas gerenciam o tempo do calor”, diz a arquiteta Carolina Moreira, que restaura sobrados no interior do RS.

  • Venezianas e brises: controlam luz e ventilação sem escurecer a casa.
  • Telhado claro e manta refletiva: reduzem ganho térmico na cobertura.
  • Forro ventilado: cria colchão de ar sob as telhas.
  • Beiral de 60–80 cm: protege janelas do sol da tarde e da chuva quente.
  • Jardim de fachada: trepadeiras e canteiros refrescam o ar que entra.

Por que isso conversa com o futuro das cidades

Cidades do Sul já encaram verões mais longos e noites quentes. A conta de luz e a saúde agradecem quando o conforto térmico nasce do projeto, não só da tomada. Reabilitar casas antigas e aplicar seus princípios em construções novas é um caminho rápido, barato e cheio de co-benefícios: menos ruído, mais sombra de rua, quintais vivos, fachadas que respiram. Não é saudosismo; é tecnologia vernacular que segue atual.

Ponto Chave Detalhe Interesse do leitor
Ventilação cruzada Aberturas opostas e exaustão por janelas altas Quartos mais frescos sem depender de ar-condicionado
Inércia térmica Parede de tijolo maciço e forro criam atraso no calor Temperatura interna mais estável ao longo do dia
Sombra inteligente Beirais, varandas, brises e arborização a oeste Redução do calor direto e da luz ofuscante

FAQ :

  • Casas antigas são sempre mais frescas?Não. Funcionam melhor quando mantêm beirais, forro ventilado e aberturas originais. Reformas que selam tudo estragam o conjunto.
  • Preciso derrubar parede para ter ventilação cruzada?Muitas vezes, não. Reposicionar portas internas e reabrir venezianas já cria percurso de ar eficiente.
  • Pintar o telhado de claro ajuda mesmo?Ajuda. Coberturas claras e mantas refletivas reduzem o ganho térmico durante as horas críticas.
  • Vale investir em persianas de madeira?
  • Vale, porque controlam luz e ventilação ao mesmo tempo, sem aquecer o vidro como cortinas pesadas.

  • O porão alto faz diferença no calor?
  • Faz. Ele separa o piso do solo quente e cria colchão de ar que estabiliza a temperatura interna.

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