O piso de cimento queimado saiu das obras e voltou para as salas de estar, cafés e escritórios. Por trás do look “cru” e bonito, engenheiros descrevem uma engenharia precisa — e uma vontade de viver com menos, sem abrir mão de conforto.
Fim de tarde em um apê de 70 m². A luz atravessa a janela, escorrega pela superfície lisa do piso cinza e revela marcas quase invisíveis, como se a casa tivesse memória. A dona comenta que o rodo desliza rápido e que, nos dias de calor, andar descalça é um alívio; o pedreiro que fez o serviço fala do capricho da desempenadeira, do tempo certo da cura, do selador que não amarela. Eu reparo no som: as rodas do carrinho do filho fazem um “tchic-tchic” doce, sem eco. Tem algo de urbano e, ao mesmo tempo, acolhedor.
Isso está voltando por um motivo.
Por que o cimento queimado voltou à moda
Os engenheiros são unânimes em um ponto: a superfície contínua resolve muito problema de obra. Menos emendas, menos rejunte, menos pontos de falha. **Numa casa que vive cheia, cada junta a menos é uma preocupação a menos.** O cimento queimado entrega essa ideia de plano único, quase um palco, onde o resto da decoração respira. E conversa com um desejo contemporâneo: ambientes limpos, materiais verdadeiros, uma certa honestidade estética que não tenta esconder a vida.
Um exemplo correu minha caixa de mensagens. Um casal de Recife trocou porcelanato brilhante por cimento queimado numa reforma enxuta; o engenheiro civil que acompanhou indicou aditivo polimérico e selador à base d’água. Em três dias, a sala parecia outra. A temperatura caiu um pouco no pico da tarde, a sujeira visual sumiu, e eles postaram no Instagram. As buscas por “cimento queimado” cresceram de novo, e os amigos perguntaram sobre custo, fissuras, manutenção. O tal “efeito conversa de corredor” que move tendência fez o resto.
Do ponto de vista técnico, há fundamentos. A massa do piso funciona como amortecedor térmico: absorve calor devagar, devolve devagar, suaviza as oscilações. Menos interfaces significa menos deslocamento diferencial — o que reduz pontos onde trinca costuma nascer. E os materiais evoluíram: hoje se usa fibra na argamassa, primer de aderência, aditivos que controlam retração. **Com junta bem planejada e cura respeitada, o risco de “mapa de trinca” despenca.** Resultado: estética de loft, sim, mas apoiada em ciência de materiais.
Como fazer direito (sem drama)
Metodologia clara ajuda. Base firme, seca e limpa; primer para criar ponte de aderência; argamassa nivelada; a “queima” com cimento seco e desempenadeira metálica no tempo certo; e, depois da cura, selador adequado ao uso do ambiente. Em áreas internas, poliuretano à base d’água costuma manter o tom natural. Em cozinhas, muita gente prefere acabamento semibrilho, que facilita a limpeza de gordura. Paciência na cura é metade do caminho.
Todo mundo já viveu aquele momento em que a ansiedade da obra pede atalho. Só que atalho aqui cobra pedágio. Não pular junta de dilatação perto de portas e vãos, não aplicar sobre madeira sem manta desacopladora, não fechar a cura em dois dias porque a mudança está chegando. Vamos ser honestos: ninguém faz isso todo dia. O truque é distribuir bem as juntas, prever rodapé que protege a borda, e testar o selador num cantinho antes de espalhar no salão inteiro.
Tem também o cuidado do dia a dia. Evite produtos ácidos, prefira detergente neutro, proteja os pés dos móveis, renove o selador quando a superfície perder “vida”. A engenheira que entrevistei resumiu assim:
“Cimento queimado é simples, mas não é descuidado. Respeite a base, a cura e a proteção de superfície, que ele te respeita de volta.”
- Limpeza: pano úmido + detergente neutro, nada de cloro forte.
- Proteção: feltros nos móveis e tapete com base respirável.
- Manutenção: re-selar a cada 18–24 meses em áreas de alto tráfego.
- Juntas: marcar no projeto onde o olho vê menos e a estrutura trabalha mais.
- Umidade: barreira de vapor em lajes térreas, sempre.
O que isso diz sobre o jeito que queremos morar
O retorno do cimento queimado fala de estética, claro, mas também de rotina. Menos coisas para limpar, menos rejuntes para branquear, menos decisões pequenas que cansam. É curioso como um material bruto vira sinônimo de cuidado. **Na prática, ele cede protagonismo a pessoas, luz, plantas, livros.** Engenheiros repetem que a boa solução é a que atravessa anos com dignidade. Talvez seja esse o encanto: um piso que não grita, que aceita arranhão, que muda de tom com a luz do dia, e que conversa bem com madeira, metal, tecido.
Há um fator ambiental que pesa: a vida útil longa. Não trocar o revestimento a cada cinco anos é parte do jogo. Sim, cimento tem pegada de carbono; o que volta a favor aqui é usar pouco material, em camada fina, e não repetir a obra sem necessidade. E tem o clima. Em boa parte do Brasil, o toque fresco no pé vale ouro. A moda passa, o conforto fica. E a casa agradece — silenciosamente.
| Ponto Chave | Detalhe | Interesse do leitor |
|---|---|---|
| Durabilidade com baixa manutenção | Selador correto e juntas bem planejadas reduzem trincas e retrabalho | Menos gastos e dor de cabeça ao longo do tempo |
| Conforto térmico | Massa do piso suaviza picos de calor e frio | Casa mais fresca sem depender só de ar-condicionado |
| Estética versátil | Superfície contínua que combina com madeira, metal e cor | Liberdade para mudar a decoração sem trocar o piso |
FAQ :
- O cimento queimado sempre trinca?Trinca é risco, não destino. Base estável, junta de dilatação e cura respeitada reduzem muito a chance.
- Posso usar na cozinha e no banheiro?Pode, com selador adequado e atenção à umidade. Em box, prefira soluções específicas e membranas.
- Dá para aplicar sobre piso antigo?Sim, se o piso estiver firme. Usa-se primer e camada técnica; um profissional avalia o descolamento.
- Fica escorregadio?O acabamento define. Fosco e semibrilho têm mais atrito; resinas certas mantêm segurança.
- Qual a diferença para microcimento?Microcimento é sistema polimérico de baixa espessura, mais controlado; a “queima” tradicional usa cimento e desempenadeira sobre argamassa.


