Um descuido rotineiro na cozinha acendeu alertas sobre segurança alimentar e trouxe à tona hábitos que muitos repetem sem perceber.
Uma nutricionista do interior de São Paulo relatou que ela e o marido precisaram de atendimento após consumir beterraba cozida que passou a noite fora da geladeira. O caso viralizou, atingiu mais de um milhão de visualizações e reacendeu a pergunta que muita gente evita: até quando um alimento “aparentemente normal” é seguro?
O que aconteceu em Lorena
Isabelly Rocha, nutricionista, cozinhou beterraba no jantar, manteve a panela tampada sobre o fogão e só descascou e serviu no almoço do dia seguinte. Horas depois, surgiram cólicas, diarreia intensa e tontura. O marido apresentou o mesmo quadro. Os dois ficaram dias debilitados e precisaram ir ao hospital.
O vídeo em que ela transforma a experiência em alerta atingiu enorme alcance. O motivo: o erro se repete em muitos lares, em qualquer estação do ano, e raramente gera sinais visuais no alimento.
A aparência engana. Comida cozida que amanhece fora da geladeira entra na zona de perigo e pode intoxicar mesmo sem cheiro ou gosto alterado.
Por que a beterraba fora da geladeira é um risco
Entre 5 °C e 60 °C, bactérias se multiplicam com rapidez. Essa faixa, conhecida como zona de perigo, acelera a produção de toxinas. Raízes e tubérculos, como beterraba, batata e batata-doce, crescem em contato direto com o solo e podem carregar microrganismos resistentes ao calor. Quando o alimento permanece morno por horas, esporos sobreviventes encontram condições perfeitas para se ativar e liberar toxinas que adoecem.
Outro engano comum é confiar no olfato. Nem toda contaminação muda cheiro, cor ou textura. A comida parece “ok”, mas a carga bacteriana já alcançou níveis capazes de provocar sintomas gastrointestinais.
Regra prática: até 2 horas em temperatura ambiente amena. Se o dia estiver acima de 30 °C, o limite cai para 1 hora. Passou disso, refrigere rapidamente ou descarte.
Tempos e temperaturas que mexem com a sua segurança
| Situação | Faixa de temperatura | Tempo máximo fora | Observação |
|---|---|---|---|
| Comida cozida na bancada | 20–29 °C | Até 2 horas | Vá para a geladeira assim que esfriar o vapor |
| Dia muito quente | ≥ 30 °C | Até 1 hora | Se passar do tempo, descarte |
| Refrigeração caseira | ≈ 4 °C | 3 a 4 dias | Use pote limpo, bem fechado e identificado |
| Reaquecimento | — | — | Ferver reduz bactérias, mas não neutraliza toxinas já formadas |
Como higienizar beterraba e outros tubérculos
Higiene adequada reduz a chance de contaminação cruzada no preparo e no consumo:
- Lave sob água corrente para retirar o excesso de terra.
- Esfregue a superfície com escovinha de uso culinário.
- Deixe de molho por 10 minutos em solução clorada (1 colher de sopa de hipoclorito para 1 litro de água).
- Enxágue bem e cozinhe normalmente.
- Use tábuas e facas limpas, separando utensílios de alimentos crus e cozidos.
Armazenamento seguro, do fogão à geladeira
Depois de cozinhar, resfrie com agilidade e guarde corretamente. O objetivo é atravessar a zona de perigo no menor tempo possível.
- Transfira para potes rasos e tampe após o vapor baixar.
- Leve à geladeira a 4 °C e consuma em 3 a 4 dias.
- Evite “amanhecer” no fogão, mesmo com a panela tampada.
- Porcione para o consumo do dia e mantenha o restante refrigerado.
- Anote data de preparo nos potes para controlar prazos.
Panela tampada não é proteção. Calor residual mantém a comida no ponto ideal para a multiplicação de bactérias.
Sintomas e quando procurar atendimento
Quadros de intoxicação alimentar costumam incluir diarreia, dor abdominal, náuseas, vômitos, fraqueza e tontura. A desidratação pode surgir rápido, principalmente em crianças e idosos.
- Sinais de alerta: diarreia intensa por mais de 24–48 horas, sangue nas fezes, febre alta persistente, vômitos que impedem hidratação, sinais de desidratação (boca seca, tontura, urina escura).
- Grupos com maior risco: gestantes, idosos, crianças pequenas, pessoas imunossuprimidas.
- Cuidados imediatos: beba pequenas porções de água, soro de reidratação ou água de coco ao longo do dia; evite bebidas alcoólicas e muito açucaradas.
Perguntas que você provavelmente tem
Posso “salvar” o alimento se ferver no dia seguinte?
Não. O aquecimento pode reduzir bactérias viáveis, mas toxinas formadas durante horas na zona de perigo permanecem ativas. Segurança alimentar não combina com “dar um jeito”.
Se a panela ficou tampada, isso não protege?
A tampa conserva calor e umidade, criando um ambiente propício para microrganismos. Sem refrigeração, o risco só aumenta.
O problema é só com beterraba?
Não. Batata, batata-doce, mandioca cozida, arroz, feijão e outros preparados também exigem refrigeração rápida. Solos e amidos favorecem microrganismos capazes de produzir toxinas gastrointestinais.
Como evitar o erro no dia a dia
Planejamento ajuda. Se cozinhar à noite para o almoço seguinte, resfrie rápido: separe em porções pequenas, distribua em potes rasos e leve à geladeira assim que parar de soltar vapor. Para grandes volumes, use banho-maria invertido (vasilha com o alimento dentro de outra com água fria e gelo) por alguns minutos antes de refrigerar.
Rotina doméstica também pede disciplina com superfícies e mãos. Lave bem as mãos antes de manipular alimentos, mantenha bancadas limpas e não reutilize utensílios sujos durante o preparo. Na hora de reaquecer, aqueça até borbulhar e sirva imediatamente.
Se bateu a dúvida sobre o tempo que a comida ficou fora, a decisão mais segura é descartar.
Informações que ampliam sua segurança
Microrganismos do solo, como os produtores de toxinas em alimentos amiláceos, toleram calor e germinam quando o alimento esfria devagar. Isso explica por que pratos “inofensivos” à primeira vista derrubam adultos saudáveis. A prevenção é muito mais barata do que uma ida ao pronto atendimento.
Uma rotina de cozinha segura combina três pilares: limpeza constante, controle de temperatura e tempo, e armazenamento adequado. Com essas regras simples, você protege sua família, ganha tempo na semana e ainda evita desperdício — sem abrir mão do sabor no prato.


