Rotina acelerada, telas até tarde e preocupação constante. Um gesto simples, barato e antigo voltou a chamar a atenção dos brasileiros.
Pesquisas recentes reacenderam o interesse por uma xícara fumegante antes de deitar. A camomila, tradição de avós e farmacinhas, aparece em estudos modernos com números que intrigam quem sofre com ansiedade e insônia. Entenda como ela age, quem pode se beneficiar e quais cuidados valem na prática.
O que a ciência já mediu
Duas revisões, publicadas em 2022 (Research, Society and Development) e 2024 (Clinical Nutrition Research), analisaram a Matricaria recutita L. e descrevem efeito ansiolítico e leve ação sedativa. Os autores destacam melhora de sintomas de ansiedade e ganhos de qualidade do sono, especialmente em pessoas sob estresse elevado.
Estudos com uso contínuo por 8 semanas indicam redução de ansiedade moderada a grave, sem prejuízo de atenção ou memória.
Os resultados não aparecem em uma única noite. Pesquisas com chá e extrato da planta mostram benefício cumulativo, com resposta mais clara após semanas de uso regular. A consistência do hábito pesa mais do que doses isoladas e grandes.
Como os compostos atuam no cérebro
Dois nomes apoiam a fama da camomila: apigenina e bisabolol. Essas moléculas interagem com receptores GABA, as mesmas “travas” neuroquímicas moduladas por ansiolíticos de prescrição. A consequência descrita nos artigos: redução da excitabilidade neuronal, relaxamento muscular e alívio de tensão.
As revisões de 2024 citam ainda a modulação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA, também chamado HPA). Esse eixo governa a resposta ao estresse. Ao suavizar a liberação de cortisol, a planta favorece um estado fisiológico mais propício ao sono e ao equilíbrio emocional.
Camomila não “desliga” o cérebro; ela ajuda a frear os estímulos exagerados que mantêm a mente em alerta.
Camomila x remédios controlados
Ensaios clínicos em Estados Unidos, Irã e Canadá encontraram efeito ansiolítico comparável ao de benzodiazepínicos em quadros leves e moderados, porém com menor risco de dependência e de sonolência intensa no dia seguinte. A diferença central está na intensidade e no perfil de ação: enquanto fármacos atuam diretamente e de modo potente, a camomila modula gradualmente os mesmos caminhos neuroquímicos.
Para boa parte dos adultos, isso abre espaço para uso complementar, sobretudo quando a meta é reduzir tensão do fim do dia e preparar o sono. Quem usa medicação psiquiátrica deve combinar estratégias com o médico assistente.
Nunca interrompa remédios de uso contínuo por conta própria. A camomila atua como aliada, não como substituta automática.
Quanto, quando e como preparar
O preparo correto preserva os compostos que interessam. Você pode seguir um ritual simples e replicável em casa:
- Use flores secas de Matricaria recutita L. de origem conhecida, com aroma fresco e cor amarelada.
- Aqueça 200 ml de água até o início da fervura; desligue antes de borbulhar vigorosamente.
- Adicione 1 colher de sopa de flores e tampe a xícara ou bule por 5 a 10 minutos.
- Coe e beba morno; evitar adoçar com açúcar refinado. Uma colher de chá de mel pode harmonizar o sabor.
- Tome 1 a 2 xícaras ao dia, preferencialmente no fim da tarde e 30 a 60 minutos antes de deitar.
Outras formas de uso e o que a evidência aponta
| Forma | Dose sugerida | Evidência típica | Cuidados |
|---|---|---|---|
| Chá de flores secas | 1–2 xícaras/dia | Melhora de tensão e do início do sono após semanas | Evite ferver as flores; risco de perder compostos voláteis |
| Extrato padronizado | Dose conforme rótulo (apigenina padronizada) | Efeito ansiolítico em 4–8 semanas | Conferir interações com medicamentos |
| Aromaterapia (óleo essencial) | Difusor ou massagem diluída | Relaxamento e melhora subjetiva do humor | Testar em pequena área; possível sensibilidade cutânea |
Quem deve redobrar a atenção
- Gestantes: evitar uso prolongado e doses concentradas; há relatos de estímulo uterino.
- Lactantes: conversar com o pediatra antes de uso contínuo; faltam dados robustos de longo prazo.
- Alergia a Asteráceas (margarida, crisântemo): risco de reação cutânea ou respiratória.
- Uso de anticoagulantes, anti-inflamatórios ou antidepressivos: chance de interação. Monitorar com o médico.
- Crianças: não oferecer a bebês; em crianças maiores, utilizar quantidades menores e observar resposta.
Seis hábitos que potencializam a xícara da noite
- Organize um horário fixo para deitar e levantar, inclusive nos fins de semana.
- Desligue telas 60 minutos antes do sono; luz azul mantém o cérebro em estado de alerta.
- Evite cafeína após as 15h; café, chá-preto, chá-mate e energéticos prolongam a vigília.
- Pratique respiração 4-7-8 ou alongamento leve para relaxar a musculatura.
- Mantenha o quarto escuro, silencioso e levemente fresco; a temperatura ajuda a induzir o sono.
- Jante cedo e de forma leve; refluxo atrapalha a arquitetura do sono.
Como escolher e armazenar sem perder qualidade
Prefira fornecedores que informem espécie botânica (Matricaria recutita L.) e data de processamento. Embalagens opacas evitam degradação por luz. Guarde as flores em pote bem fechado, ao abrigo de calor e umidade. Aroma muito fraco, cor pálida demais ou presença de pó excessivo sugerem perda de ativos.
Perguntas frequentes que você sempre faz
Em quanto tempo começo a sentir efeito?
Muita gente relata relaxamento na primeira semana. Estudos controlados descrevem melhora consistente entre a quarta e a oitava semana, quando o uso é diário.
Camomila dá sono de manhã?
Geralmente não. O efeito relaxante aparece mais próximo do consumo. Se você sentir sonolência pela manhã, reduza a dose noturna ou antecipe o horário da última xícara.
Posso misturar com melatonina ou magnésio?
Em adultos saudáveis, a combinação costuma ser bem tolerada. Quem toma remédios para dormir, antidepressivos ou ansiolíticos deve alinhar a estratégia com o médico para evitar sobreposição de efeitos.
Existe diferença entre camomila-alemã e romana?
Sim. A camomila-alemã (Matricaria recutita L.) é a mais estudada para ansiedade e sono. A romana (Chamaemelum nobile) também é aromática, mas reúne menos evidência clínica nesse campo.
Quando o chá pode falhar — e o que fazer
Ansiedade persistente, despertares frequentes e sensação de falta de ar durante a noite apontam para condições como apneia do sono, transtornos de ansiedade ou depressão. Nesses cenários, a camomila ajuda, mas não resolve sozinha. Busque avaliação médica para diagnóstico e plano completo, que pode incluir terapia cognitivo-comportamental, ajustes de estilo de vida e, se necessário, medicação.
Para ir além da xícara
Se você gosta de dados e rotina, registre em um diário de 30 dias: horário do chá, quantidade, tempo para adormecer, despertares e humor ao acordar. Essa planilha simples mostra padrões, orienta ajustes e serve de base para uma conversa objetiva com profissionais de saúde.
Quem pratica atividade física pode incluir a camomila após o treino noturno para atenuar a excitação do exercício. Já em dias de estresse alto, uma infusão mais encorpada no fim da tarde reduz a transição brusca entre trabalho e descanso, ajudando o corpo a “baixar a marcha” no momento certo.


