Extrema planta água há 20 anos: você, morador, sente a diferença nas contas e nas torneiras?

Extrema planta água há 20 anos: você, morador, sente a diferença nas contas e nas torneiras?

No alto da Mantiqueira, a terra respira e a água volta a correr. Uma experiência local chama atenção nacional.

Extrema, no Sul de Minas, trocou discurso por prática e transformou o cuidado com a floresta em sinônimo de torneira cheia. A iniciativa começou em 2005 e reuniu produtores rurais dispostos a cercar nascentes, replantar mata nativa e mudar o uso do solo. A cidade batizou o caminho de “Conservador das águas” e fez dele uma política permanente.

O que significa plantar água

Plantar água não é metáfora vazia. Quando o produtor protege a nascente e restaura a vegetação no alto da bacia, o solo ganha cobertura, infiltra melhor e alimenta os aquíferos. As raízes quebram a compactação, seguram a chuva e reduzem enxurradas. O resultado aparece no período seco, quando a vazão se mantém por mais tempo.

Reflorestar no topo da bacia aumenta a infiltração e sustenta a vazão da nascente no auge da estiagem.

Essa lógica forma o coração do trabalho em Extrema, na Serra da Mantiqueira. O município entendeu cedo que conservar a mata custa menos do que ampliar captações e tratar água barrenta. Ao apoiar o produtor, a prefeitura reduz erosão, assoreamento de córregos e queima de bomba elétrica para puxar água.

Conservador das águas: pagamento que vira floresta

O programa municipal remunera agricultores por serviços que beneficiam toda a bacia. A prática se baseia no pagamento por serviços ambientais. O produtor que protege a nascente, cerca a área, planta espécies nativas e mantém a floresta em pé recebe por isso. A prefeitura acompanha, define metas e vistoria as áreas.

O que o produtor faz na propriedade

  • Cerca e isola nascentes para impedir pisoteio e contaminação do gado.
  • Planta mata ciliar com espécies nativas e controla o capim em volta da nascente.
  • Instala terraços, bacias de contenção e curvas de nível para segurar enxurradas.
  • Adota manejo de pasto rotacionado para manter o solo coberto o ano inteiro.
  • Cuida do saneamento básico rural para evitar esgoto em córregos.

A contrapartida financeira dá previsibilidade. O dinheiro ajuda a comprar mourões, arame, mudas e insumos. A assistência técnica mostra onde abrir caixas de retenção, como desenhar cercas e quais espécies plantar. A cada safra, o produtor vê o capim dar lugar a árvores e a água limpar.

Pagar por serviços ambientais cria renda estável e alinha o negócio rural com a conservação da bacia.

Resultados visíveis em 20 anos

Na prática, moradores relatam córregos menos turvos após chuva forte. Nascentes ganharam sombra, resfriaram a água e passaram a alimentar pequenos reservatórios. A fauna retornou para áreas onde só havia pasto. A experiência virou referência brasileira e inspirou municípios vizinhos da Mantiqueira.

Onde a mudança aparece primeiro

  • Nascentes com vazão mais estável no inverno.
  • Água com menos sedimentos após temporais.
  • Redução de voçorocas e ravinas nas encostas.
  • Biodiversidade maior em trechos antes degradados.
  • Economia de energia com menos necessidade de bombear de longas distâncias.
Ação na propriedade Efeito na água
Cercar e sombrear a nascente Menos evaporação e contaminação, temperatura mais baixa
Plantar mata ciliar Filtragem de sedimentos e nutrientes antes de chegar ao córrego
Construir terraços e bacias Infiltração maior e pico de enchente reduzido
Manejo rotacionado de pasto Solo coberto o ano todo, erosão menor
Saneamento rural adequado Menos coliformes e melhor qualidade para consumo animal e humano

O caso do produtor Vanildo de Oliveira Bastos ilustra a virada. Ele cercou as cabeceiras, replantou espécies nativas e viu olhos d’água reaparecerem em áreas onde o gado antes pisoteava. A água voltou a sair clara, mesmo depois de pancadas de chuva. A propriedade ganhou sombra, pássaros e nova dinâmica de produção.

Como sua cidade pode replicar

O caminho exige organização, medição de resultados e participação de quem vive na bacia. A experiência de Extrema mostra que o arranjo funciona quando a prefeitura, os comitês de bacia e os produtores falam a mesma língua e definem metas mensuráveis por microbacia.

Passos práticos

  • Mapear nascentes, áreas de recarga e trechos críticos de erosão por microbacia.
  • Selecionar produtores interessados e assinar termos de adesão com metas anuais.
  • Criar um fundo local para pagamento por serviços ambientais, com governança clara.
  • Oferecer assistência técnica, viveiro de mudas e insumos para cercas e plantio.
  • Monitorar vazão, turbidez e cobertura de solo com indicadores simples e periódicos.

Riscos e pontos de atenção

  • Pagar sem vistoria reduz resultados e descredibiliza o programa.
  • Plantio sem manutenção nos dois primeiros anos compromete a restauração.
  • Escolha errada de espécies aumenta mortalidade de mudas e custos.
  • Acordos curtos não estimulam manejo de longo prazo.
  • Falta de saneamento rural contamina nascentes já restauradas.

Metas claras, contratos de longo prazo e monitoramento simples sustentam a política e garantem confiança do produtor.

O que você, morador, pode fazer hoje

Quem vive na cidade também entra no ciclo. A separação de resíduos reduz entupimentos de galerias. O uso de caixas de retenção em casas em declive segura parte da água da chuva. O plantio de espécies nativas em quintais próximos a cursos d’água aumenta a infiltração. A participação em audiências de comitês de bacia ajuda a direcionar recursos para as microbacias mais críticas.

Termos que valem guardar

Pagamento por serviços ambientais é o instrumento que remunera práticas que geram benefícios coletivos, como água mais limpa e estável. Mata ciliar é a vegetação que acompanha rios e córregos e atua como filtro natural. Bacia de contenção é uma pequena estrutura que segura a água da chuva por alguns minutos, suficiente para infiltrar no solo. Esses três elementos articulados formam a base da estratégia de “plantar” água.

Por que a Mantiqueira importa para quem mora longe

A Serra da Mantiqueira abastece cidades em três estados com nascentes e rios que nascem no alto. O que acontece nas encostas reverbera nas capitais e polos industriais. Quando uma microbacia segura a chuva, toda a calha do rio sente. Programas como o de Extrema reduzem custos de tratamento, evitam racionamentos e dão previsibilidade para quem depende da água para produzir e viver.

A série “Plantando Água”, produzida pela Mais Conteúdo, acompanha histórias de quem viu a mudança brotar na porteira de casa. Relatos como o de Vanildo reforçam que restauração e renda podem caminhar juntas. O exemplo desafia outras prefeituras a transformar discurso em ação com metas, contratos e acompanhamento contínuo. E convida cada morador a fazer parte da recarga que começa no quintal e termina na caixa d’água.

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