Uma ação de promotores e policiais movimentou o Centro de Juiz de Fora e deixou muita gente olhando para a bomba com desconfiança.
Moradores viram viaturas e mandados sendo cumpridos em um endereço conhecido, enquanto surgiam relatos de dinheiro vivo, carros de luxo e bens bloqueados. O caso reacende a pergunta que atinge qualquer motorista: o preço e a qualidade do combustível que você paga refletem a lei ou um esquema obscuro?
O que se sabe até agora
O Ministério Público de Minas Gerais deflagrou a segunda fase da Operação Fernão de Noronha e mirou uma família suspeita de usar o Posto Central, na Avenida Francisco Bernardino, como fachada para sonegar tributos e lavar dinheiro. Os investigadores apontam movimentações irregulares desde 2008, com a expansão do patrimônio por meio de imóveis, veículos e negócios ligados ao transporte e à logística de combustíveis.
Seis prisões, 16 buscas, bloqueio de contas e sequestro de 26 veículos e sete imóveis: a engrenagem financeira do grupo, segundo o MPMG, veio à tona.
Mandados e alvos
Promotores e equipes especializadas cumpriram ordens judiciais em Juiz de Fora na manhã desta terça-feira, 4 de novembro de 2025. Cinco homens e uma mulher foram presos. A mulher, advogada e irmã do principal investigado, seguiu para Uberlândia, única cidade mineira com cela especial em presídio feminino.
- 6 mandados de prisão expedidos e cumpridos;
- 16 ordens de busca e apreensão;
- Sequestro de 26 veículos e 7 imóveis, além do bloqueio de contas até o limite do valor desviado;
- Apreensão de R$ 50 mil em espécie, parte no posto e parte na casa do alvo principal.
O principal investigado passou mal durante o cumprimento dos mandados. Ele recebeu atendimento do Samu e permanece internado sob escolta em um hospital da cidade.
Os bens, dizem os promotores, apareciam em nome da mãe e da irmã do suposto operador do esquema para evitar rastreamento direto.
Como funcionava o esquema, segundo o MPMG
De acordo com a apuração, a família criou uma estrutura empresarial para usar a personalidade jurídica do Posto Central como escudo. A suspeita envolve sonegação de ICMS em cadeia, com notas fiscais incompatíveis, subfaturamento e uso de empresas de fachada. O dinheiro teria circulado em espécie com frequência, roda que se retroalimenta quando existe mistura entre caixa formal e informal.
Os promotores relatam que a prática teria sido consolidada por mais de uma década, permitindo a compra de imóveis e a formação de uma frota valiosa, além de investimentos em atividades de transporte e logística de combustíveis. A Justiça determinou o bloqueio de contas e o sequestro de bens para resguardar eventual ressarcimento ao erário, estimado em mais de R$ 63 milhões.
Garagens clandestinas e risco ao consumidor
Na primeira fase da operação, em 2021, investigadores localizaram garagens clandestinas usadas para armazenar combustível sem observar normas da Agência Nacional do Petróleo. A prática levanta suspeitas de adulteração e de receptação de produto furtado. Além do dano tributário, esse tipo de irregularidade atinge diretamente o motorista.
Combustível adulterado encarece a manutenção, eleva o consumo, danifica o motor e, em casos extremos, provoca falhas perigosas durante a condução.
Quem toca a investigação
A Coordenadoria Regional da Ordem Econômica e Tributária (Caoet) conduz o caso, com apoio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) da Zona da Mata. A integração de equipes tributárias e criminais mira simultaneamente a prova financeira, o fluxo de notas e as rotas de abastecimento.
O que dizem os envolvidos
A defesa do posto e do sócio-administrador Paulo Alexandre Moreira, representada pelo advogado André dos Santos Policante, informou que só se manifestará após ter acesso integral aos autos e às decisões judiciais. As defesas dos demais citados não haviam se pronunciado até a publicação deste texto. A Secretaria de Justiça e Segurança Pública ainda avalia a situação prisional de Moreira.
Linha do tempo e principais pontos
| Período | Fato apontado |
|---|---|
| 2008 | Início da sonegação de tributos, com acúmulo patrimonial em imóveis e veículos, segundo o MPMG. |
| 2021 | 1ª fase da Operação Fernão de Noronha; apreensões e identificação de garagens clandestinas. |
| 04/11/2025 | 2ª fase: 6 prisões, 16 buscas, sequestro de 26 veículos e 7 imóveis e R$ 50 mil em espécie. |
Como postos viram alvo de lavagem e sonegação
O setor de combustíveis movimenta alto volume e dinheiro vivo, o que facilita a mistura entre receitas lícitas e ilícitas. Três engrenagens costumam aparecer em investigações:
- Interposição de pessoas: abertura de empresas em nome de familiares para diluir a origem do patrimônio.
- Notas fiscais com valores incompatíveis: subfaturamento na compra e venda para reduzir ICMS e mascarar margens.
- Armazenamento irregular: depósitos clandestinos facilitam recepção de combustível fora das normas e dificultam a fiscalização.
Quando a arrecadação do ICMS cai por causa da sonegação, o prejuízo recai sobre serviços públicos locais e estaduais. A lavagem de dinheiro, por sua vez, tenta dar aparência legal ao que nasce do crime, reinjetando recursos em ativos, empresas ou bens de luxo.
Direitos do consumidor e como se proteger
Você pode adotar medidas simples para reduzir riscos e fortalecer a fiscalização do mercado.
- Desconfie de preços muito abaixo da média da cidade em todos os combustíveis simultaneamente.
- Guarde a nota fiscal e marque a quilometragem a cada abastecimento para identificar variações no consumo.
- Observe a transparência na bomba, os lacres e os selos de aferição do Inmetro.
- Percebeu falhas no motor, luz de injeção acesa logo após abastecer ou odor fora do comum? Registre com fotos e procure assistência técnica.
- Relate suspeitas aos órgãos de defesa do consumidor, à ANP, ao Ministério Público ou à Polícia Civil da sua cidade.
Preço milagroso, uniforme em todos os combustíveis, não existe; diferença persistente abaixo da média acende alerta.
Aspectos legais que podem surgir no processo
Casos assim costumam envolver crimes contra a ordem tributária e lavagem de dinheiro. A primeira frente trata de fraudes para reduzir ou eliminar o pagamento de tributos. A segunda atinge atos que disfarçam a origem dos valores obtidos com essas fraudes. Também podem aparecer acusações de organização criminosa. As penas variam conforme a participação de cada investigado, valores envolvidos, duração do esquema e eventual cooperação com as autoridades.
Medidas cautelares e o caminho do caso
As autoridades já implementaram bloqueios de contas e sequestro de bens, mecanismos que preservam valores para futura reparação. Depois das buscas, é comum que peritos analisem notas, planilhas, mídias e extratos. A partir daí, o Ministério Público pode oferecer denúncia, pedir novas quebras de sigilo e, se for o caso, negociar acordos com quem colaborar de forma efetiva.
O que observar no dia a dia dos postos
Para ampliar a segurança do consumidor, vale adotar uma rotina prática. Compare preços entre três ou mais estabelecimentos, priorize marcas e locais com histórico conhecido e evite abastecer sempre no mesmo horário ou bomba. Oficinas relatam que abastecimentos alternados ajudam a identificar padrões de desempenho do veículo. Em caso de problema, a nota fiscal e os registros de manutenção valem como prova para buscar reparação.


