Milhões de brasileiros convivem com gordura no fígado sem perceber. Quando o corpo envia alertas discretos, a rotina já mudou.
A condição ganhou nome novo na medicina, MASLD, e cresce junto com a obesidade e o sedentarismo. Você pode não beber álcool e mesmo assim acumular gordura no fígado. A boa notícia: dá para reverter com mudanças objetivas e acompanhamento profissional.
O que é MASLD e por que atinge quem não bebe
A Doença Hepática Gordurosa Associada à Disfunção Metabólica (MASLD), antes chamada de NAFLD, é o acúmulo de gordura nas células do fígado sem relação com álcool. O fígado resiste por anos, mas a sobrecarga abre caminho para inflamação (MASH), fibrose e cirrose. O processo nasce do desequilíbrio metabólico: ganho de peso, resistência à insulina, excesso de açúcares e ultraprocessados.
Mais de 70% dos casos cursam sem dor. A ausência de sintomas não significa fígado saudável.
Sintomas que passam batido
Os sinais surgem de forma sutil e variam. O corpo fala, só que baixo.
- Cansaço persistente após tarefas simples.
- Desconforto leve no lado direito do abdômen, abaixo das costelas.
- Inchaço abdominal e sensação de plenitude precoce.
- Aumento de enzimas hepáticas nos exames de sangue.
- Piora de triglicerídeos e glicemia, mesmo com dieta “normal”.
Se você tem obesidade, diabetes tipo 2, pressão alta ou colesterol elevado, faça check-ups periódicos.
Como confirmar o diagnóstico
O primeiro passo é avaliar o sangue. Médicos analisam ALT, AST e GGT. Depois, a imagem esclarece a extensão do acúmulo de gordura e o risco de fibrose.
| Exame | O que mostra | Quando usar |
|---|---|---|
| Ultrassom de abdômen | Presença de gordura (“esteatose”) | Investigação inicial e acompanhamento |
| Elastografia (fibroscan) | Rigidez do fígado e risco de fibrose | Estratificação de risco e monitoramento |
| Biópsia hepática | Confirma inflamação e grau de fibrose | Casos selecionados e dúvidas diagnósticas |
Quem corre mais risco
O principal fator é a obesidade. O excesso de gordura corporal alimenta a resistência à insulina e deposita lipídios no fígado. O perigo aumenta com síndrome metabólica, diabetes tipo 2, triglicerídeos altos, colesterol alterado e hipertensão. Pessoas com peso “normal”, mas dieta pobre, sono ruim e sedentarismo, também entram no mapa. Crianças e adolescentes com consumo frequente de bebidas açucaradas já apresentam esteatose.
Prevenção que funciona na vida real
Perder de 5% a 10% do peso reduz a gordura hepática de forma mensurável. Esse intervalo costuma baixar enzimas e melhorar a sensibilidade à insulina.
Metas realistas vencem promessas milagrosas: 0,5 kg a 1 kg por semana, com refeição planejada e atividade física regular.
Plano prático para as próximas 8 semanas
- Corte bebidas adoçadas, inclusive “zero” e light. Água, café sem açúcar e chá são aliados.
- Troque ultraprocessados por comida de verdade: feijão, arroz integral, ovos, frutas e verduras.
- Dê prioridade a proteínas magras e gorduras boas: peixe, frango, iogurte natural, azeite, castanhas.
- Inclua 150 a 300 minutos/semana de atividade aeróbica e 2 sessões de musculação.
- Durma 7 a 8 horas. Sono curto bagunça hormônios da fome e piora a glicose.
- Monitore a cintura: acima de 88 cm (mulheres) e 102 cm (homens) indica maior risco metabólico.
O padrão mediterrâneo ajuda quem precisa de um guia simples: prato colorido, azeite no lugar da fritura, peixe mais vezes na semana, grãos integrais e baixa carga de açúcares simples.
O que há de novo na ciência
GLP-1 e melhora do fígado
Agonistas de GLP-1, como a semaglutida, mostraram melhora de marcadores hepáticos em MASLD e na forma inflamatória, MASH. Esses medicamentos reduzem peso, inflamam menos o fígado e melhoram a resistência à insulina. Uso exige prescrição e acompanhamento, já que nem todo paciente precisa ou se beneficia.
Adoçantes artificiais não são passe livre
Estudos recentes associaram bebidas adoçadas, inclusive versões diet e “zero”, a risco maior de fígado gorduroso. O metabolismo não “desliga” com o sabor doce. A estratégia mais segura continua sendo reduzir a doçura geral da dieta e focar em alimentos in natura ou minimamente processados.
Bebida doce, com ou sem açúcar, mantém o fígado sob pressão. Água ainda é a melhor política.
Quando procurar ajuda
Marque consulta se você vive cansado, ganhou peso rápido, tem cintura aumentada ou alterações em exames. Profissionais avaliam fatores de risco, solicitam imagem e calculam escores de fibrose. Quem já tem diabetes, apneia do sono ou hipertensão precisa de monitoramento sem atrasos.
Agenda de interesse público
No dia 5 de novembro, às 7h30, o Hospital das Clínicas da UFPE receberá a edição pernambucana do Brazilian Mash Road, encontro que reúne cirurgiões bariátricos e hepatologistas para discutir diagnóstico e tratamento da esteatose metabólica. O evento tem apoio da SBCBM e da SBH.
Mais caminhos para proteger o fígado
- Café coado sem açúcar se associa a menor risco de fibrose em estudos observacionais.
- Estatinas costumam ser seguras em MASLD e reduzem risco cardiovascular, grande causa de morte nesses pacientes.
- Vitamina E pode ser considerada em casos selecionados de MASH sem diabetes, com orientação médica.
- Jejum noturno de 12 horas ajuda a baixar triglicerídeos e reduz beliscos noturnos ricos em açúcar.
Ferramentas para o dia a dia
Checklist semanal
- Passos/dia: 8 mil a 10 mil, subindo escadas e caminhando após refeições.
- Prato meio verde: metade vegetais, um quarto proteína, um quarto carboidrato integral.
- Bebidas: água como padrão; evitar sucos prontos e refrigerantes, mesmo “zero”.
- Exames: controle de ALT/AST de 3 em 3 a 6 meses, conforme orientação.
Perguntas que você pode levar à consulta
- Meu risco de fibrose é baixo, intermediário ou alto?
- Preciso de elastografia agora ou posso repetir o ultrassom depois da perda de peso?
- GLP-1 é indicado no meu caso ou dieta e exercício já bastam?
- Quais metas de peso e cintura devo alcançar nos próximos 3 meses?
Pequenas vitórias somadas derrubam a gordura do fígado: menos açúcar líquido, mais movimento e acompanhamento regular.


