A rotina com comprimidos parece inofensiva. Pequenas falhas de dose e combinações erradas, repetidas no dia a dia, cobram caro.
A morte de Lô Borges, aos 73 anos, confirmada pelo Hospital Unimed e pela família, acendeu um alerta sobre remédios e segurança. O músico estava internado desde 17 de outubro por intoxicação medicamentosa e, segundo boletim médico, morreu por falência múltipla de órgãos. Entenda como um quadro tóxico pode desencadear um colapso sistêmico e o que você pode fazer para reduzir riscos em casa.
O que se sabe sobre a morte de Lô Borges
Lô Borges, referência do Clube da Esquina, foi internado em Belo Horizonte após um quadro de intoxicação medicamentosa. A equipe médica informou falência múltipla de órgãos como causa da morte. O termo descreve quando dois ou mais órgãos vitais deixam de cumprir suas funções, e o corpo perde a capacidade de se recuperar.
Falência múltipla é um desfecho que pode seguir uma cadeia: agressão tóxica, inflamação sistêmica, queda de perfusão e colapso de órgãos como fígado, rins e pulmões.
Especialistas descrevem que a falência de órgãos pode ser reversível nos estágios iniciais se a causa for rapidamente identificada e tratada. Em fases avançadas, surgem danos irreversíveis, como fibrose e necrose tecidual, que impedem a recuperação.
O que é falência múltipla de órgãos
É a perda progressiva de função de órgãos vitais. Afeta sistemas como fígado, rins, coração, pulmões, intestino e cérebro. Pode ocorrer de forma súbita, após um evento agudo, ou se instalar de maneira gradual quando a agressão persiste.
- Fígado: reduz metabolização de drogas e toxinas, gerando acúmulo de substâncias.
- Rins: falha na filtragem, retenção de potássio e ácido, inchaço e confusão mental.
- Pulmões: queda da oxigenação, falta de ar e necessidade de suporte ventilatório.
- Coração: arritmias e queda de pressão diminuem a perfusão de tecidos.
- Cérebro: sonolência, agitação, convulsões e perda de consciência.
Segundo centros clínicos de referência, tratar a causa inicial cedo aumenta a chance de reversão. Atraso no diagnóstico acelera o dano permanente.
Como a intoxicação medicamentosa leva ao colapso
Remédios salvam vidas, mas sua margem de segurança depende de dose, interação e do estado do organismo. Em intoxicação, a concentração da substância ou de seus metabólitos supera o que o corpo consegue processar. O fígado e os rins, que fazem a “limpeza”, sofrem primeiro. Se esses órgãos falham, outras funções entram em cascata.
A intoxicação pode ser:
| Tipo | Origem comum | Exemplo | Possível dano |
|---|---|---|---|
| Aguda | Superdose acidental ou erro de prescrição | Analgésico em dose repetida sem intervalo | Hepatite medicamentosa, arritmia, convulsão |
| Crônica | Acúmulo por uso prolongado | Benzodiazepínicos e álcool juntos | Queda, depressão respiratória, déficit cognitivo |
| Interação | Combinação que altera metabolismo | Antibiótico que potencializa anticoagulante | Sangramento, insuficiência renal |
Idosos têm risco maior. Mudanças na composição corporal e na função de fígado e rins fazem a mesma dose agir de forma diferente. Doenças crônicas e múltiplas receitas aumentam as chances de interação. Automedicação agrava o cenário, inclusive com produtos “naturais” que interferem no metabolismo de fármacos.
Sinais que pedem ação rápida
O corpo costuma dar pistas antes do colapso. Ignorar sintomas atrasa o resgate e estreita as possibilidades de reversão.
- Náusea persistente, vômitos ou dor abdominal após uso de remédios.
- Sonolência excessiva, confusão, fala arrastada ou desmaio.
- Icterícia (olhos ou pele amarelados), urina escura ou coceira intensa.
- Falta de ar, respiração lenta ou irregular.
- Batimento acelerado ou descompassado, tontura ao levantar.
Percebeu piora rápida após um comprimido a mais, uma troca de receita ou mistura com álcool? Procure atendimento sem esperar “passar”.
Como reduzir o risco em casa
Pequenos hábitos reduzem drasticamente erros de dose e choques entre medicamentos.
- Liste todos os produtos que usa: prescritos, sem receita, fitoterápicos e vitaminas.
- Leve a lista a consultas. Pergunte sobre interações e ajuste de dose para idade e rim.
- Use organizadores semanais e alarmes. Evite frascos soltos e comprimidos fora da cartela.
- Jamais dobre dose porque “não fez efeito”. Efeito terapêutico nem sempre é imediato.
- Evite álcool com psicotrópicos, opioides, relaxantes musculares e antialérgicos sedativos.
- Cheque rótulos de analgésicos combinados para não somar o mesmo princípio ativo.
- Em caso de doença aguda (vômitos, diarreia, febre alta), confirme com o médico se deve pausar algum remédio, sobretudo anti-inflamatórios e diuréticos.
O papel do hospital e por que a janela de tempo conta
Nos serviços de emergência, a equipe tenta identificar a substância envolvida, a dose e o tempo de exposição. Exames avaliam fígado, rins, pulmões e coração. Dependendo do caso, podem ser usados antídotos específicos, carvão ativado em janela curta, suporte ventilatório e hemodiálise.
Quando a inflamação sistêmica se instala, o tratamento passa a sustentar os órgãos enquanto o corpo depura a toxina. Se o insulto persiste ou se o dano já é extenso, a falência se expande para outros sistemas. Por isso, minutos e horas fazem diferença.
Onde buscar ajuda e que informações levar
Emergência médica deve ser acionada diante de sinais neurológicos, respiratórios ou cardiovasculares. No Brasil, o Disque-Intoxicação do SUS atende pelo 0800 722 6001, 24 horas, com orientação sobre medidas imediatas até a chegada ao serviço.
- Leve as embalagens e descreva horários e quantidades tomadas.
- Informe doenças pré-existentes e alergias.
- Avise se houve ingestão de álcool ou outras substâncias.
Perguntas úteis para sua próxima consulta
Organize dúvidas por escrito. Isso ajuda a evitar lacunas e reforça a segurança do tratamento.
- Este remédio interage com algo que já uso? Alguma comida ou bebida interfere?
- Qual sinal indica que devo reduzir, pausar ou procurar o pronto atendimento?
- Qual é o plano se eu esquecer uma dose? Posso repor? Quando?
- Meu rim e meu fígado exigem ajuste de dose? Com que frequência devo checar exames?
Contexto que amplia a discussão
O caso reacende a conversa sobre polifarmácia e segurança do paciente fora do hospital. A combinação de prescrições de diferentes especialistas, mais produtos sem receita, cria zonas de risco em famílias inteiras. Um “simples” anti-inflamatório pode desequilibrar pressão, rim e estômago; um xarope sedativo somado a um ansiolítico derruba a respiração durante o sono.
Para quem cuida de pais ou avós, vale montar um calendário visível, checar regularmente o estoque e padronizar horários. Simulações em casa, como treinar o que fazer se alguém tomar dose duplicada, reduzem erros em momentos de estresse. Guardar remédios em locais seguros evita confusões com crianças e visitas.


