Novas regras trabalhistas prometem mexer no bolso de empresas e no planejamento das famílias com bebês, adoção e guarda.
A Câmara dos Deputados aprovou mudanças que redesenham a licença-paternidade. O texto cria transição, define quem financia, garante estabilidade e condiciona a última etapa a metas fiscais.
Como será a transição ano a ano
O projeto de lei 3.935/08, de origem no Senado, amplia a licença-paternidade de 5 para 20 dias em quatro anos. A Câmara alterou o texto e o enviou de volta ao Senado para revisão final.
| ano de vigência da lei | tamanho da licença |
|---|---|
| 1º e 2º anos | 10 dias |
| 3º ano | 15 dias |
| 4º ano | 20 dias (com gatilho fiscal) |
A virada para 20 dias só valerá se o governo cumprir a meta fiscal prevista para o 2º ano de vigência.
Se a meta desse período não for cumprida, os 20 dias entram em vigor apenas a partir do segundo exercício financeiro após o cumprimento. Depois de implantados, descumprimentos futuros de metas não reduzem o direito já estabelecido.
Para conter custos, o relator reduziu a proposta original. Estimativas apontavam impacto de R$ 4,34 bilhões em 2027 para 10 dias. Se fosse a 30 dias em 2030, o efeito chegaria a R$ 11,87 bilhões.
Quem tem direito e como solicitar
Pais biológicos, adotantes e guarda judicial
Recebe o benefício o empregado que for pai, adotar ou obtiver guarda judicial de criança ou adolescente. O direito vale também para trabalhadores avulsos, domésticos e contribuintes individuais, respeitadas as regras previdenciárias de cada categoria.
Criança com deficiência: acréscimo de 1/3
Nos casos de criança com deficiência, a licença aumenta em um terço. Isso eleva 10 dias para cerca de 13, 15 dias para 20 e 20 dias para cerca de 27.
Quem paga a conta
Hoje, os 5 dias previstos na Constituição saem do caixa da empresa ou do órgão público. Com a ampliação, o salário-paternidade entra na folha da Previdência Social, com compensações para empregadores.
- Empregado CLT: a empresa paga e compensa o valor nas contribuições devidas ao INSS.
- Micro e pequenas empresas: podem compensar o salário-paternidade no recolhimento de qualquer tributo federal.
- Trabalhador avulso e empregado de MEI: pagamento direto pelo INSS.
- Empregado doméstico: valor igual ao último salário de contribuição, pago pelo INSS (piso de um salário mínimo).
- Segurado especial sem contribuição facultativa: recebe um salário mínimo.
- Contribuinte individual ou facultativo: recebe 1/12 da soma dos 12 últimos salários de contribuição, dentro de janela máxima de 15 meses.
O salário-paternidade pode ser pago ao mesmo tempo que o salário-maternidade quando se tratar da mesma criança, adoção ou guarda para adoção.
Regras de uso e divisão
O trabalhador poderá dividir a licença em dois períodos iguais, a pedido, salvo em caso de falecimento da mãe. O primeiro período começa imediatamente após o parto, a adoção ou a guarda judicial. O segundo deve iniciar em até 180 dias após o parto ou a adoção.
Durante a licença, o pai não pode exercer atividade remunerada. A norma pede presença efetiva nos cuidados e na convivência com a criança ou adolescente.
Férias podem ser emendadas à licença, desde que o empregado informe essa intenção 30 dias antes da data prevista para o parto ou para a guarda. Em parto antecipado, não há exigência de aviso prévio.
Se a mãe ou o recém-nascido permanecer hospitalizado com nexo com o parto, a licença é prorrogada pelo período de internação. O tempo original volta a correr a partir da alta do último a sair.
Proteção no emprego e punições
Há estabilidade contra demissão arbitrária durante a licença e até um mês após o fim. Caso o empregado tenha avisado a data de início e seja demitido antes de usufruir, a indenização será de dois meses de salário.
Se houver divisão em dois períodos, a proteção começa no fim do primeiro bloco. Demissão antes do segundo bloco gera indenização simples em caso de pedido de demissão ou dispensa por justa causa. Em dispensa imotivada, a indenização é em dobro.
Estabilidade se estende por todo o período da licença e por mais um mês. A demissão indevida sai caro.
Violência doméstica e salvaguardas
Quando houver indícios concretos de violência doméstica ou familiar, ou de abandono material em relação à criança ou adolescente sob responsabilidade do pai, o INSS pode negar ou suspender a licença. O Judiciário também pode suspender ou indeferir, mediante provocação do Ministério Público, da mulher em situação de violência ou do responsável pela vítima.
Os parâmetros seguem o Código Penal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código Civil e a Lei Maria da Penha.
Situações especiais
Registro sem mãe
Se o registro civil de nascimento não tiver o nome da mãe, o pai tem direito a licença de 120 dias, igual à licença-maternidade, com estabilidade ampliada no emprego nos mesmos moldes previstos para gestantes.
União homoafetiva
Não há concessão do mesmo tipo de licença para ambos na adoção ou guarda conjunta. Em março de 2024, o STF reconheceu que a mãe não gestante em união homoafetiva tem direito à licença-maternidade. Se a gestante utilizar esse benefício, a outra parceira acessa a licença-paternidade. O CNJ também regulamentou a distribuição: um dos pais ou mães tem licença-maternidade; o outro, licença-paternidade.
Impacto fiscal e condicionantes
O relator, deputado Pedro Campos, defendeu a medida como reforço ao cuidado nos primeiros dias de vida da criança, etapa sensível para a família. Para fechar acordo, a transição ficou mais curta e com teto em 20 dias. O salto final depende do cumprimento da meta fiscal do segundo ano de vigência.
Os cálculos oficiais projetam impacto relevante nas contas públicas. A calibragem por metas e etapas tenta equilibrar o aumento do benefício e o ritmo de ajuste fiscal.
Efeitos previdenciários e Empresa Cidadã
Para aposentadoria e demais benefícios, o salário-paternidade contará como salário de contribuição. Esse período entra no tempo e no valor usados nos cálculos previdenciários.
Empresas participantes do programa Empresa Cidadã seguem autorizadas a estender a licença-paternidade por mais 15 dias, com dedução no Imposto de Renda. Com a nova lei, esses 15 dias se somam aos 20 regulamentares, totalizando 35 dias nas empresas aderentes.
Responsabilidade parental e continuidade do benefício
Se o segurado que estiver recebendo salário-paternidade (ou a segurada, no caso de salário-maternidade) falecer, a pessoa que assumir legalmente as responsabilidades parentais pode continuar a receber o valor pelo período restante. Para isso, precisa ser segurada da Previdência. O pagamento cessa se a criança vier a falecer ou for abandonada.
Quanto você pode receber: guia prático
- Empregado CLT e avulso: valor igual à remuneração integral no mês de afastamento.
- Doméstico: igual ao último salário de contribuição.
- Segurado especial sem contribuição facultativa: um salário mínimo.
- Contribuinte individual/facultativo: média de 12 contribuições, limitada a janela de 15 meses.
Simulações rápidas para o seu caso
Empregado CLT
Se você recebe R$ 3.000 mensais e tira 15 dias no 3º ano de vigência, o benefício cobre os 15 dias de salário proporcional, pago pela empresa com compensação no INSS. Em empresa do Empresa Cidadã, o total pode chegar a 30 dias nesse estágio (15 regulamentares + 15 do programa).
Contribuinte individual
Suponha 12 contribuições de R$ 2.000 nos últimos 15 meses. O benefício mensal de referência é R$ 2.000; o salário-paternidade será calculado pela regra de 1/12 da soma, aplicado ao período de licença.
Família com criança com deficiência
Com licença de 10 dias no 1º ano, o acréscimo de 1/3 leva o total a cerca de 13 dias. No 4º ano, 20 dias viram cerca de 27.
Como se preparar no trabalho e em casa
Avise o RH com antecedência sobre a possibilidade de dividir a licença. Combine tarefas com a equipe para reduzir impactos em prazos. Se optar por emendar férias, formalize o pedido a tempo. Organize a rotina doméstica para os primeiros dias, quando o cuidado exige presença, consultas e ajustes de sono.
Para famílias que planejam adoção, mapeie a documentação da guarda judicial e o momento provável da chegada. Isso acelera o pedido do benefício e evita perda de dias.
Perguntas que evitam dor de cabeça
- Já tenho os documentos para comprovar nascimento, adoção ou guarda no RH e no INSS?
- A empresa participa do Empresa Cidadã? Se sim, como formalizo os 15 dias adicionais?
- Quero dividir a licença. Qual será a data do segundo período dentro dos 180 dias?
- Haverá internação do bebê ou da mãe? Guarde laudos para prorrogar a licença.
- Sou contribuinte individual? Minhas 12 contribuições cabem na janela de 15 meses?


