Uma decisão administrativa vira a chave no ABC e reacende debates sobre mobilidade urbana, emprego, imóveis e rotina de quem circula pela região.
A área da antiga fábrica da Ford, em São Bernardo do Campo, avançou de fase no projeto da Linha 20-Rosa do Metrô. Uma resolução recém-publicada autoriza desapropriações no bairro Paulicéia para erguer o pátio operacional que vai sustentar o novo eixo de ligação do ABC ao centro de São Paulo.
O que foi decidido
A Secretaria de Parcerias em Investimentos do governo paulista declarou de utilidade pública parte do antigo complexo da Ford, em Paulicéia. A medida, formalizada pela Resolução SPI nº 075 de 28 de outubro de 2025 e publicada no Diário Oficial em 31 de outubro, permite que o Metrô de São Paulo inicie desapropriações amigáveis ou judiciais.
O perímetro autorizado soma 227.609 metros quadrados. O destino é específico: construção do Pátio Ford da Linha 20-Rosa, infraestrutura que concentrará oficinas, estacionamento de trens, setores administrativos e o centro de controle que toca a operação diária.
Resolução SPI nº 075/2025 autoriza a desapropriação de 227.609 m² em Paulicéia para o Pátio Ford da Linha 20-Rosa.
O texto ainda permite que o Metrô invoque caráter de urgência, previsto no Decreto-Lei 3.365/1941. Esse instrumento jurídico abre caminho para imissão provisória na posse, acelerando o cronograma de obras. As despesas sairão do orçamento da própria companhia, e as benfeitorias existentes poderão ser demolidas conforme os projetos.
Por que o Pátio Ford é peça-chave
Pátios são o coração de qualquer linha de metrô. Eles concentram manutenção pesada e leve, limpeza, abastecimento, testes e organização do carrossel de trens. Sem pátio, não há operação confiável. No caso da Linha 20-Rosa, o Pátio Ford funcionará como base do ramal que conectará Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul à região central, com integração à Linha 2-Verde nas proximidades da Avenida Paulista.
O terreno em questão tem passado emblemático. O antigo complexo industrial da Ford, desativado em 2019, foi adquirido por um fundo ligado à Prologis por R$ 850 milhões. O governo já adiantou que entre 25% e 30% da gleba será destinada ao Metrô. O restante deve abrigar um centro logístico privado.
Como ficam os empregos e a convivência com o centro logístico
A conciliação de usos — pátio metroviário e plataforma logística — cria uma dinâmica urbana mista. A estimativa é de até 25 mil empregos diretos e indiretos com o empreendimento privado. O pátio, por sua vez, gera vagas técnicas e contratos de serviços especializados. Essa combinação tende a reaquecer a economia local, desde que o planejamento de acessos, circulação de caminhões e mitigação de ruído siga boas práticas urbanísticas.
Cronograma e primeiro canteiro no ABC
O governo estadual sinalizou que as obras da Linha 20 começam pelo Grande ABC. Paralelamente, avança a desapropriação de áreas no Taboão, também em São Bernardo, e o planejamento de um segundo pátio próximo à estação Santa Marina, na Lapa, zona oeste. Essas frentes permitirão fasear a implantação e distribuir riscos técnicos.
As frentes de obra no ABC devem abrir caminho para testes de via e pátio antes da ligação completa até a região central.
Impacto para moradores e empresas de Paulicéia
A desapropriação por utilidade pública prevê indenização justa, com base em avaliação técnica do valor de mercado. Quando há urgência reconhecida, a Justiça pode autorizar a posse provisória, mediante depósito prévio. Para quem vive ou tem negócio na área afetada, organização de documentos e diálogo cedo com as equipes responsáveis ajudam a reduzir incertezas.
- Mantenha matrícula atualizada do imóvel e certidões básicas à mão.
- Registre benfeitorias com fotos, notas fiscais e plantas.
- Acompanhe publicações e visitas técnicas para entender limites e prazos.
- Negocie avaliação e compensações com base em laudos independentes, quando necessário.
- Verifique condições de reassentamento ou apoio temporário em casos de imóveis operacionais.
Projetos desse porte também trazem intervenções no viário. O entorno deverá receber ajustes para pedestres, ciclistas, ônibus e carga, reduzindo conflitos entre fluxos do pátio e do centro logístico. Medidas típicas incluem barreiras acústicas, manejo de solo e monitoramento de vibração em áreas sensíveis.
Linha 20-Rosa em números e integrações
| Extensão prevista | 31 km |
| Estações estimadas | 24 |
| Trecho funcional | Lapa – Santo André |
| Demanda diária plena | cerca de 1 milhão de passageiros |
| Carga no pico | aprox. 32 mil passageiros/hora/sentido |
O traçado conecta centralidades como Lapa, Pinheiros, Itaim Bibi, Vila Olímpia, Moema, Cursino, Rudge Ramos e Santo André, além de interfaces com o sistema sobre trilhos e corredores de ônibus.
- Integração prevista com linhas: 6-Laranja, 10-Turquesa, 1-Azul, 5-Lilás, 19-Celeste, 22-Bordô, 4-Amarela, 2-Verde, 7-Rubi e 8-Diamante.
- Atendimento a eixos viários de alto fluxo, como Rebouças, Faria Lima, Nove de Julho, José Diniz/Ibirapuera/Santa Cruz, Cursino, Rudge Ramos, Lauro Gomes, Presidente Kennedy, dos Estados, além do Corredor ABD e das rodovias Anchieta e Imigrantes.
A Linha 20-Rosa nasce com vocação perimetral e papel distribuidor, aliviando as linhas que atravessam o centro e criando novas rotas transversais. Isso encurta deslocamentos, dilui lotação e reequilibra a rede.
O que muda na sua viagem diária
A conexão entre ABC e áreas como Vila Olímpia, Itaim e Paulista tende a reduzir trocas de modal e tempo parado em terminais. A presença de estações de integração bem dimensionadas com ônibus municipais e metropolitanos permite redesenhar linhas alimentadoras para trajetos mais curtos e frequentes.
Riscos, cuidados e próximos passos
Projetos com desapropriação ampla podem suscitar contestações judiciais que afetam prazos. A invocação de urgência acelera frentes de obra, mas exige disciplina na execução de obras de contenção, drenagem e gestão de tráfego para prevenir transtornos. Licenciamento ambiental, desapropriações no Taboão e o pátio na Lapa compõem um quebra-cabeça que precisa avançar coordenado.
Para moradores e trabalhadores, mudanças chegam por etapas. Primeiro, atividades de campo e sondagens. Depois, canteiros, desvios viários e implantação do pátio. A comunicação clara sobre janelas de obra, ruído e itinerários de ônibus ajuda a manter a rotina possível durante a transição.
Para entender: o que é a desapropriação por utilidade pública
A Constituição e o Decreto-Lei 3.365/1941 permitem ao poder público desapropriar imóveis para obras de interesse coletivo, com indenização prévia e justa. Em casos com urgência reconhecida, o juiz pode autorizar a posse provisória após depósito inicial. Laudos técnicos sustentam os valores, e proprietários têm direito de questionar avaliações e propor acordos.
No caso do Pátio Ford, a desapropriação viabiliza a base operacional de uma linha estimada para atender 1 milhão de pessoas por dia. A decisão molda o uso do solo em um território simbólico da indústria automobilística, redesenhando vocações e abrindo espaço para atividades com maior densidade de serviços, tecnologia e logística.
Como aproveitar oportunidades e reduzir riscos
Quem atua com locação, pequeno comércio ou serviços pode mapear as frentes de obra e adequar contratos ao calendário de intervenções. Bairros com novas estações tendem a valorizar imóveis próximos a eixos de pedestres e ciclovias. Em contrapartida, obras pesadas elevam ruído e poeira temporariamente. Investimentos em vedação, horários de carga e descarga reorganizados e atenção a rotas alternativas ajudam a atravessar a fase de canteiro com menos impacto.
A chegada do pátio e da Linha 20-Rosa no ABC altera padrões de deslocamento e incentiva uma economia mais conectada. Esse redesenho urbano demanda participação ativa de moradores e empresas nas audiências e consultas, para que os projetos de integração viária, travessias e paisagismo reflitam necessidades reais do território.


