No sul paulista, um set pequeno e atento às sutilezas da paisagem transformou a luz em linguagem. A conversa cresceu no meio audiovisual.
Gravado nas áreas verdes de Itararé, o novo comercial de um coletivo brasileiro chegou às fases decisivas de uma premiação mundial dedicada à cor e à pós-produção. A obra disputa duas categorias e levou o nome da cidade ao circuito de festivais, com equipe jovem, escolhas estéticas precisas e uma combinação rara entre tecnologia e simplicidade de filmagem.
Da paisagem ao set
O projeto nasceu do retorno do diretor e roteirista Matheo Fernandes, 24, à cidade em que cresceu. Ele enxergou nos campos, nas rochas e nos tons do céu uma oportunidade de filmar com ritmo calmo e imagens construídas à margem do óbvio. A proposta não era exibir produto de forma agressiva, e sim integrar o objeto ao ambiente para que a luz contasse a história.
O filme concorre nas categorias comercial e talento emergente, com cerimônia marcada para 16 de novembro, na Polônia.
Equipe enxuta, resultado preciso
Quatro profissionais do coletivo assinaram a produção e a direção. A fotografia ficou a cargo do dinamarquês Nicholas Bluff, com atenção rigorosa ao controle de contrastes. A finalização de cor levou a assinatura da colorista alemã Franziska Heinemann, que trabalhou a paleta para conservar a organicidade do material captado e evitar exageros digitais.
- Locação: áreas verdes de Itararé (SP), com vegetação nativa e formações rochosas.
- Equipe central: direção/roteiro de Matheo; direção de fotografia de Nicholas Bluff; cor por Franziska Heinemann.
- Captação: película de 35 mm, priorizando textura, latitude e grão.
- Pós-produção: realizada em Berlim, com pipeline voltado a preservar tons naturais.
- Metodologia: set compacto e operação ágil para aproveitar janelas de luz.
Tecnologia para uma luz mais natural
A ideia de base veio de um colega europeu que apresentou tecidos reflexivos criados para cinema e fotografia. Diferentemente dos refletores metálicos ou painéis brancos, esses materiais são inspirados em elementos brasileiros — areia, céu, floresta e concreto — e devolvem a luz de modo mais suave, com matizes próximos ao ambiente real.
Reflexos que carregam cor: o tecido “céu” tende a esfriar altas luzes; “areia” aquece pele; “floresta” puxa verdes; “concreto” controla brilho urbano.
35 mm como escolha estética
A película entrou como aliada. O 35 mm permite latitude ampla, mantém transições de sombra e dá densidade ao verde do cenário. A decisão reduziu a dependência de correções pesadas na pós e favoreceu uma estética menos polida, mais tátil.
Quem é Matheo Fernandes
Nascido na capital paulista e criado em Itararé até os 17 anos, Matheo voltou a São Paulo para se dedicar ao audiovisual. Ele trabalha com publicidade há cinco anos, período em que formou o núcleo do coletivo responsável pelo filme. Sua trajetória começou com fotografia experimental, o que explica a atenção a superfícies, texturas e composição cromática.
| Fato | Detalhe |
|---|---|
| Idade do diretor | 24 anos |
| Cidade de filmagem | Itararé (SP) |
| Captação | Película 35 mm |
| Categorias no prêmio | Comercial e Talento emergente |
| Pós-produção | Realizada em Berlim |
| Equipe internacional | Diretor de fotografia dinamarquês; colorista alemã |
| Data da cerimônia | 16 de novembro, na Polônia |
Rota de festivais e expectativas
O comercial já foi selecionado em um festival recente em Berlim, onde figurou entre finalistas em cinco categorias. A presença constante em vitrines fora do país validou a estratégia da equipe: orçamento contido, conceito forte e colaboradores de áreas específicas somando olhar global.
Independência com método: planejamento fechado, decupagem enxuta e decisões claras sobre o que filmar em cada janela de luz.
O impacto para o interior
O caso de Itararé vibra com um ponto sensível do audiovisual brasileiro: a possibilidade de polos criativos fora das capitais. A cidade oferece logística simples, custos menores e cenários pouco saturados. Quando um trabalho desse porte circula no exterior, abre caminho para novas filmagens, qualificação técnica e renda local.
Como esse set trabalhou a cor
O pipeline de finishing privilegiou ajustes finos de contraste, equilíbrio de pele e preservação do verde nativo. A colorista aplicou correções seletivas para manter a coerência entre planos e evitar saltos perceptíveis de temperatura. O resultado busca uma sensação de tempo real, sem filtros agressivos nem saturação excessiva.
- Exposição: medição por zonas para proteger altas luzes.
- Balanço de branco: fixo por cena para estabilidade cromática.
- Tratamento: curvas suaves e máscaras para calibrar pele e céu.
- Grão: preservado da película para reforçar textura.
O que o público pode perceber
O ritmo do filme desacelera. Planos abertos mostram a relação entre personagem, tecido e vento. Close-ups revelam microcontrastes na pele e no tecido reflexivo. A trilha não compete com as imagens. A narrativa deixa a paisagem conduzir o olhar, enquanto o produto funciona como mediador entre sol e personagem.
Por que funciona
Quando o objeto de cena não ocupa o centro de atenção, a história respira. A marca aparece como parte do ambiente, e não como elemento intruso. Essa abordagem aumenta a memorabilidade em campanhas que apostam na experiência visual como argumento.
Informações que ajudam quem quer filmar no interior
Produções pequenas podem alcançar festivais especializados quando dominam um recorte técnico. No caso do comercial de Itararé, o recorte foi cor e luz natural. Abaixo, um roteiro prático para equipes que pretendem trilhar caminho semelhante.
- Defina um eixo técnico: cor, som direto, animação ou montagem. Foque nele.
- Mapeie janelas de luz por estação; crie um cronograma por angulação e hora.
- Teste materiais reflexivos e superfícies locais; fotografe cartas de cor no set.
- Monte um pipeline simples de pós com LUTs de trabalho e backups redundantes.
- Pesquise prêmios de nicho (cor, VFX, edição) e leia regulamentos com prazos.
- Forme parcerias com profissionais de fora para ampliar repertório sem inflar a equipe.
Custos, riscos e ganhos de filmar em 35 mm
Película traz textura e latitude, mas exige disciplina. Cada plano precisa de propósito. O custo por rolo impõe ensaio e storyboard precisos. O risco está no desperdício de metragem e na logística do laboratório. Em contrapartida, o ganho estético reduz retrabalho em color grading e evita aquela aparência excessivamente digital em cenas externas.
Caminhos para transformar cidades em polos de gravação
Itararé ilustra um movimento possível. Uma cidade entra no mapa quando oferece licenças ágeis, catálogo de locações e profissionais locais capacitados. Um banco de imagens municipal ajuda produtoras a avaliar viabilidade. Oficinas de set e de assistência de câmera formam a base. Parcerias com escolas e coletivos aceleram a chegada de projetos maiores.
Quando a comunidade apoia, o set aparece. Quando o set aparece, surgem empregos, serviços e novas histórias para filmar.
Para o público, o interesse está em ver lugares conhecidos na tela com outra luz. Para os profissionais, fica um recado: método, conceito e colaboração cruzam fronteiras. E o interior, quando vira personagem, encontra plateia no mundo inteiro.


