Sem chuva, calor extremo e redes antigas pressionam famílias, hospitais e negócios. Teerã encara semanas decisivas para sua rotina.
Autoridades em Teerã soaram o alarme: a principal represa que abastece a capital iraniana caiu a níveis críticos. Sem redução firme no consumo e sem chuva, 10 milhões de pessoas podem ver as torneiras falharem em questão de dias.
O que está secando a capital
O ano hidrológico veio fraco. As chuvas ficaram entre 40% e 45% abaixo da média histórica, com províncias que registraram cortes superiores a 70%. As temperaturas subiram, ampliando a evaporação. A pressão sobre rios, represas e aquíferos aumentou.
A crise não nasce só do clima. O uso agrícola responde por cerca de 90% da água do país, com irrigação ineficiente e culturas de alta demanda hídrica, como arroz e cana, em áreas áridas. A extração subterrânea avança desde os anos 1970; estimativas apontam esgotamento de mais de 70% das reservas.
Teerã depende de cinco represas; uma delas, Lar, opera perto de 1% do nível normal. O risco de “dia zero” entrou no calendário.
A queda nos reservatórios
O nível da represa Amir Kabir, principal fonte da capital, recuou para 14 milhões de m³ — um ano atrás eram 86 milhões de m³. No ritmo atual de consumo, a água tratada cobre cerca de duas semanas.
Imagens recentes mostram o rio Karaj cruzando o leito em filetes. Em Latyan, os níveis também encostam em mínimas históricas. O quadro reduz a capacidade de regular pressão, distribuir de forma estável e produzir energia.
| Represa | Situação em 2025 | Papel no abastecimento |
|---|---|---|
| Amir Kabir (Karaj) | 14 milhões de m³; queda acentuada | Principal fonte de água tratada |
| Lar | Aproximadamente 1% do nível normal | Complementar para a capital |
| Latyan | Mínimos históricos relatados | Rede metropolitana |
Quando chega o dia zero
O termo define a virada em que a rede deixa de garantir água contínua e parte da cidade passa a rodízio. Caminhões-pipa e fontanários públicos entram na rotina. Hospitais e serviços essenciais recebem prioridade. Bairros inteiros podem ficar horas sem água. Em prédios altos, a queda de pressão seca as caixas rapidamente.
Sem reduzir consumo, bairros entram em rodízio. Quem tem caixa d’água no telhado segura melhor; quem não tem enfrenta filas.
O que muda para as famílias
- Rodízio por zonas e horários, com aviso curto.
- Pressão irregular; chuveiros e torneiras podem parar de funcionar nos andares altos.
- Fontes públicas e caminhões-pipa atendem áreas críticas.
- Com a energia oscilando, elevatórias e bombas falham, alongando interrupções.
- Comércio e escolas ajustam horários, e serviços públicos fecham em dias de menor oferta.
Efeito dominó na energia
Reservatórios vazios derrubam a geração hidrelétrica. Usinas a gás ficam sobrecarregadas por causa do ar-condicionado e das bombas de água. Em julho, a demanda elétrica bateu 69 mil MW, acima dos ~62 mil MW necessários para estabilidade. Apagões de duas a quatro horas viram rotina, com impacto maior nos mais pobres, que não conseguem manter geradores.
O governo vem fechando repartições para economizar e afirma perseguir mineradores ilegais de criptomoedas, apontados por drenar a rede. A medida, porém, não evita as críticas: moradores cobram prioridade às residências e transparência sobre quem consome mais.
Vazamentos, solos que afundam e perdas ocultas
Até 22% da água tratada em Teerã se perde em vazamentos por corrosão e rede envelhecida. O fenômeno é global: serviços europeus relatam perdas médias de 25%, e concessionárias americanas calculam 14% a 18% — com casos extremos acima de 60%.
Subsolos exauridos perdem sustentação; há distritos afundando até 25 cm por ano. O rebaixamento do terreno trinca adutoras, amplia perdas e ameaça pontes e monumentos. É a espiral de “falência da água”: danos acumulados que já não cedem só com chuva e boa vontade.
Perdas de 22% por vazamentos e aquíferos colapsando alimentam uma espiral: menos água, mais falhas, mais desperdício.
O que governo e especialistas propõem
O presidente Masoud Pezeshkian pediu corte de 20% no consumo domiciliar. A demanda caiu 13% em julho ante o ano anterior, mas técnicos calculam que outra redução — na casa de 12% — seria necessária para atravessar o período seco de setembro e outubro.
No médio prazo, o país promete reduzir 45 bilhões de m³ por ano em sete anos com reuso, irrigação por gotejamento e modernização da rede. O plano é ambicioso e encara sanções, burocracia e falta de investimento. Pesquisadores descrevem o momento como teste de política pública: a resposta precisa integrar água, solo e energia.
O recado do “dia zero” para o mundo
A agência da ONU para desertificação lembra que secas cresceram 29% desde 2000. Se a curva seguir, três em cada quatro pessoas sentirão os efeitos em 2050. A experiência de Cidade do Cabo, entre 2015 e 2018, mostra que metas por pessoa, tarifas calibradas e comunicação constante podem segurar o pior.
Como a crise bate na sua porta
Megacidades dependentes de represas e aquíferos, como as da Ásia e do Oriente Médio, compartilham vulnerabilidades: estiagens longas, calor extremo, perdas na rede e uso agrícola intenso. O caso de Teerã revela o que acontece quando todos esses vetores se somam.
Para o leitor, o número que decide a história é simples: quanto você consegue cortar sem perder saúde e dignidade? Em cenários de racionamento, metas de 20% a 30% viram linha de base. A conta rápida ajuda:
- Consumo típico urbano: 150 litros por pessoa/dia.
- Família de quatro: 600 litros/dia.
- Meta de corte de 20%: 120 litros/dia a menos.
- Como chegar lá: banho 2 minutos mais curto (−24 a −30 litros), máquina de lavar cheia (−40 a −60 litros), conserto de um vazamento simples (−20 a −40 litros), torneira fechada ao ensaboar (−15 a −20 litros).
Pistas para sair do aperto
Especialistas listam medidas de curto prazo que entregam efeito rápido: caça a vazamentos visíveis e ocultos; redução de pressão noturna nos bairros; reuso interno em indústrias de maior consumo; priorização transparente entre setores; e linhas de crédito para caixas d’água comunitárias em áreas vulneráveis.
No horizonte de alguns anos, duas frentes definem o desfecho: eficiência agrícola com gotejamento e rotação de culturas, e uma governança que ajuste demanda à realidade hídrica. Em cidades, medição por faixa de consumo, tarifas escalonadas e bônus por economia criam espaço para a rede respirar nos meses mais secos.
A velocidade da ação decide se a água chega à sua torneira no auge do calor. O relógio de Teerã já está correndo.


