Dor nas costas, ombros pesados e um fim de contrato. Aconteceu com um operador e pode bater à sua porta.
Um operador de máquinas que atuou por quase três décadas em uma cooperativa agroindustrial conseguiu, no Tribunal Superior do Trabalho, uma virada que interessa a quem sente o corpo cobrar no fim da jornada. A Corte reconheceu o direito à indenização substitutiva de estabilidade por doença ocupacional constatada apenas depois da demissão, recolocando no debate quando o trabalhador pode exigir salários do período em que deveria ter sido protegido contra a dispensa.
O caso que acendeu o sinal: dor, laudo e demissão
O trabalhador começou em 1995 como auxiliar de serviços gerais e, depois, operou máquinas até 2022. Ele relatou dor constante na coluna e nos ombros, atribuída ao ritmo e às condições do posto. Um laudo pericial confirmou o nexo entre as atividades e as lesões, apontando agravamento durante o contrato.
Na primeira instância, o juiz condenou a cooperativa ao pagamento de danos materiais e morais e à indenização equivalente ao período de estabilidade de 12 meses após a dispensa. O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) retirou a parte da estabilidade, sob o argumento de que a doença só foi reconhecida depois do término do contrato e que não houve afastamento pelo INSS.
No recurso ao TST, a 2ª Turma restabeleceu o direito à estabilidade substituída por indenização. A relatora, ministra Delaíde Miranda Arantes, aplicou a Súmula 378 do TST, que admite a proteção mesmo quando a constatação da doença ocupacional vem após a rescisão.
Doença ocupacional reconhecida equivale a acidente de trabalho. A estabilidade nasce do vínculo entre a lesão e a atividade, ainda que o diagnóstico formal chegue depois da dispensa.
Por que a estabilidade valeu sem afastamento do INSS
A Súmula 378 do TST prevê, como regra, que a estabilidade de 12 meses se aplica quando o empregado fica afastado por mais de 15 dias e recebe auxílio-doença acidentário. Só que o texto também traz uma exceção: quando a doença profissional aparece comprovada após a demissão, vinculada ao serviço prestado, a garantia se mantém.
O TST entendeu que o laudo já mostrava lesões durante o contrato, com o operador trabalhando com dor. A ausência de benefício do INSS não elimina a proteção. O ponto central ficou no nexo causal entre doença e trabalho, evidenciado pela perícia.
Não recebeu benefício? Ainda assim, se o trabalho causou a lesão, a proteção legal pode render 12 meses de salários em forma de indenização substitutiva.
O que muda para você, trabalhador
Se você sente dor persistente, usa medicação para suportar a jornada ou percebe limitação funcional, o precedente serve de farol. Ele mostra como agir para não perder direitos quando a demissão chega antes do diagnóstico formal.
- Registre as queixas médicas e peça encaminhamento para exames. Guarde receitas e atestados.
- Solicite abertura da CAT, mesmo sem afastamento. Sindicato e o próprio trabalhador podem emitir.
- Anote tarefas, pesos, posturas e ritmos. Fotos e relatos cronológicos fortalecem a prova.
- Procure perícia independente se a empresa negar nexo com o trabalho.
- Observe prazos: até 2 anos após a dispensa para ingressar com ação; dentro dela, cobram-se direitos dos últimos 5 anos.
Estabilidade, indenização e reflexos: o que pode entrar na conta
Quando o juiz substitui a reintegração por indenização, ele costuma considerar o que você receberia durante a estabilidade. O cálculo varia conforme a sentença, mas, em geral, inclui:
- Salários mensais do período de 12 meses.
- 13º proporcional do período abrangido.
- Férias com adicional de 1/3 relativas ao período.
- Depósitos de FGTS e multa de 40% sobre a base do período, conforme o caso.
Adicionais habituais podem compor a base: periculosidade, insalubridade, horas extras médias e adicional noturno. A perícia contábil apura valores, e a decisão fixa os critérios.
| Situação | Possível direito | Base jurídica |
|---|---|---|
| Doença ocupacional reconhecida após a demissão | Indenização substitutiva da estabilidade (12 meses) | Súmula 378, II, do TST |
| Afastamento superior a 15 dias com benefício B91 | Estabilidade por 12 meses após o retorno | Art. 118 da Lei 8.213/91 |
| Agravamento de lesão causado pelo trabalho | Danos materiais e morais, além de pensão em casos graves | CF, art. 7º, XXVIII; CC, arts. 186 e 927 |
O que a cooperativa contestou e por que perdeu
A cooperativa alegou falta de prova do nexo e inexistência de estabilidade por ausência de afastamento previdenciário. O laudo técnico afastou a versão patronal ao relacionar as tarefas às lesões. O TST aplicou a exceção da Súmula 378, justamente porque a doença, embora silenciosa por anos, já existia quando a demissão ocorreu.
O processo também trouxe um recado para quem mantém pessoas lesionadas em operação normal: o fato de o empregado continuar ativo não suprime direitos quando a dor já indica agravo ocupacional.
Trabalhar com dor não normaliza a dor. Quando a atividade agrava a lesão, nasce responsabilidade e proteção contra a dispensa arbitrária.
Prevenção e gestão: o que as empresas precisam fazer já
- Mapear riscos e adotar ergonomia efetiva (NR-17) e gestão de riscos ocupacionais (PGR).
- Implementar rodízio, pausas e análise de postos com foco em coluna e ombros.
- Emitir CAT sempre que houver suspeita de nexo e encaminhar para avaliação.
- Registrar queixas em prontuário ocupacional e readequar tarefas com rapidez.
- Treinar lideranças para identificar sinais de dor e evitar sobrecarga.
Como agir se você vive situação parecida
Guarde tudo o que prova a rotina: ordens de serviço, vídeos do posto de trabalho, cronogramas de produção, conversas sobre dor. Procure atendimento no SUS ou plano e peça encaminhamento para ortopedia e fisiatria. Peça ao médico que descreva a relação entre a atividade e a lesão. Esse vínculo técnico ajuda no processo.
Se a empresa negar a emissão da CAT, protocole você mesmo. Exija exame demissional minucioso. Se a clínica do trabalho não registrar queixas, redija declaração própria e peça protocolo. Com esses elementos, um pedido de perícia judicial costuma avançar.
Exemplo prático de cálculo
Imagine salário-base de R$ 2.800, com média de R$ 400 de horas extras mensais. A base mensal chega a R$ 3.200. Em 12 meses, o valor bruto alcança R$ 38.400. Some 13º proporcional (R$ 3.200) e férias com 1/3 (R$ 4.266,67). Dependendo da decisão, entram depósitos de FGTS do período e multa correspondente. O juiz pode atualizar valores e aplicar juros.
Informações úteis para ampliar sua proteção
Doença ocupacional difere de doença comum. O benefício B91 (acidentário) gera estabilidade; o B31 (comum) não gera. Mesmo sem benefício, a jurisprudência admite a estabilidade quando a perícia comprova o nexo após a dispensa, como no caso julgado pela 2ª Turma do TST.
O Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário pode reforçar a relação entre certas atividades e doenças típicas de coluna e ombro. Esse indicador não encerra a discussão, mas ajuda a compor o quadro com laudos e exames. Quanto mais cedo você documenta a dor, mais clara fica a trilha de provas.
Para quem já saiu da empresa, o relógio corre. A Justiça do Trabalho admite ação até dois anos após a rescisão. Enquanto isso, não ignore a reabilitação: fisioterapia, reforço muscular e adaptação ergonômica aceleram a volta ao trabalho e reduzem o risco de agravamento.
O processo em questão, julgado pela 2ª Turma do TST e relatado pela ministra Delaíde Miranda Arantes, trata de operador que trabalhou entre 1995 e 2022 e recebeu decisão favorável à indenização substitutiva da estabilidade de 12 meses. A mensagem alcança quem sente a coluna reclamar diante do esforço diário: dor que nasce do trabalho não é detalhe, é direito em disputa.


