De um bairro de Goiânia ao palco europeu, uma história de forno aceso, farinha boa e ambição que mexe com o apetite.
Nos próximos dias, um pizzaiolo nascido em Itapuranga chega a Salerno, na Itália, para medir massa, fogo e criatividade contra mestres de vários países. No cardápio da missão, respeito às raízes e um plano simples: emocionar o júri com técnica, sabor e identidade brasileira.
Quem é o goiano que chega a Salerno
Geneon Sérgio Brandão, 60 anos, leva o Brasil ao Campeonato Mundial Pizza D.O.C., competição que ganhou o apelido de “Oscar da Pizza”. Natural de Itapuranga, no Vale do São Patrício, ele cresceu vendo a família cozinhar e transformou essa convivência em ofício. Hoje comanda a Com Alecrim Pizzaria, no Setor Coimbra, em Goiânia, conhecida por massas de fermentação natural, forno a lenha e ingredientes de estação.
Raízes em Itapuranga, forno em Goiânia
A infância entre panelas o fez perceber cedo que comida reúne pessoas. Anos depois, a cozinha virou destino. Antes da farinha e do molho, ele empreendeu no setor automotivo. A mudança de rota veio com o sucesso das pizzas em reuniões com amigos. A casa própria nasceu, o forno acendeu e a clientela consolidou um estilo que casa tradição italiana com sotaque goiano.
O representante brasileiro aposta na combinação de técnica clássica, fermentação natural e arranjos de sabor que dialogam com a mesa goiana.
O que está em jogo no “Oscar da Pizza”
O Mundial Pizza D.O.C. acontece de 11 a 13 de novembro, em Salerno, sul da Itália. A sigla D.O.C. remete à Denominação de Origem Controlada, referência para processos autênticos desde a farinha até a cocção. O torneio reúne pizzaiolos de vários países, com provas que cobram precisão, respeito a métodos tradicionais e uma boa dose de autoria.
| Quando | Onde | Foco da disputa |
|---|---|---|
| 11 a 13 de novembro | Salerno, Itália | Massa bem trabalhada, cocção perfeita, equilíbrio de ingredientes e criatividade com base clássica |
Os jurados costumam analisar textura da massa, leveza, borda corretamente desenvolvida, ponto de forno, harmonia entre molho, queijo e coberturas, além da apresentação. O ritmo de execução e a limpeza da bancada contam pontos, já que organização interfere no resultado final.
- Massa: elasticidade, aroma de fermentação e alveolos visíveis sem ressecar.
- Forno: temperatura constante e cor uniforme na borda.
- Ingredientes: frescor, corte adequado e combinações coerentes.
- Técnica: abertura sem rasgar, montagem rápida, assamento no tempo certo.
- Autoria: inovação que respeita tradições, sem exageros ou elementos que se anulam.
Três dias, múltiplas provas e um objetivo claro: mostrar que o Brasil domina técnica e sabor na linguagem da pizza.
A receita que vai na bagagem
Na Com Alecrim, a massa nasce com fermentação natural e descanso prolongado, o que traz leveza e digestibilidade. O molho privilegia tomate em ponto correto de doçura e acidez. A lenha entrega a caramelização que a pizza precisa para ganhar textura e aroma. Essa base deve guiar a apresentação em Salerno.
Tradição italiana, identidade goiana
O plano é respeitar as regras clássicas e incluir, com cuidado, referências regionais. Isso pode aparecer em ervas frescas, queijos do Centro-Oeste e toques de acidez ou picância moderada. O objetivo não é empilhar ingredientes, e sim construir camadas de sabor que contem uma história: Itália no método, Brasil no acento.
Fermentação natural, ingredientes frescos e forno a lenha formam o tripé que sustenta a proposta brasileira no campeonato.
Da graxa ao molho: a virada de carreira
Antes de vestir o avental todos os dias, Geneon dirigia um negócio no ramo automotivo. O que começou como pizza para amigos virou profissão. Trocar a graxa pelo molho significou estudo, prática e ajustes finos de processo, do blend de farinha ao manejo do forno. O aprendizado constante virou marca registrada da pizzaria e agora orienta a rotina pré-competição.
Treino de competição
A preparação inclui repetição dos movimentos, marcação de tempo de bancada, simulação de assamento em sequência e padronização de porcionamento. A meta é atingir regularidade, diminuir variações de temperatura e de hidratação na massa e construir uma apresentação limpa. O termômetro do sucesso vem no corte: fatias que mantêm estrutura, com borda crocante por fora e macia por dentro.
Como o leitor pode participar dessa conversa
Quem ama pizza consegue perceber parte dos critérios do júri em casa. Um roteiro simples ajuda a treinar o paladar e valorizar boas práticas.
- Olhe a borda: deve ter cor amendoada com pontos escuros, sem gosto de queimado.
- Sinta o aroma: massa boa cheira a trigo e fermentação, não a álcool.
- Dobre a fatia: ela cede sem quebrar e não desaba de óleo.
- Prove em etapas: uma mordida só de massa, outra com molho, depois com a cobertura completa.
- Observe o equilíbrio: nenhum ingrediente deve gritar mais que os outros.
D.O.C., fermentação e forno: por que isso importa
D.O.C. é um selo que valoriza origem e método. Na pizza, esse conceito se traduz em farinha adequada, tomate de qualidade, queijo correto e técnicas consistentes. Esse conjunto entrega previsibilidade de resultado e preserva referências históricas, sem bloquear novas leituras de sabor.
Fermentação natural não é moda passageira. Leveduras e bactérias trabalham devagar, liberando aromas e melhorando a digestão. Para quem assa em casa, vale testar descanso longo e hidratação mais alta, ajustando a abertura para não rasgar a massa. O risco de apressar o processo é produzir discos densos e pesados.
O forno é o outro personagem decisivo. No lenho, o calor radiante e a chama ativa criam bordas altas e alveoladas. No elétrico doméstico, pré-aquecer bem a pedra ou assadeira grossa e levar o molho mais encorpado ajuda a evitar encharcar a base. O ganho vem na textura: crocância externa, miolo úmido e macio.
O que esperar dos próximos passos
Os três dias de prova pressionam físico e mente. Ritmo de serviço, fila de assamento e ajustes de hidratação variam com clima e farinha local. Uma estratégia eficaz prioriza poucas receitas bem treinadas e montagem precisa. O leitor pode acompanhar esse tipo de disputa observando detalhes que contam pontos: borda uniforme, respeito a porções, cortes em tamanhos regulares e apresentação limpa na bancada.
Se o troféu voltar com o representante goiano, ganha a cena brasileira como um todo: mais visibilidade para processos artesanais, mais espaço para produtores de farinha e queijo e mais curiosidade do público por pizzas com identidade. E, caso não venha, o aprendizado acumulado segue no forno, saindo em cada disco que chega à mesa dos clientes em Goiânia.


