Um ponto tradicional de Lagoa Nova entrou no radar das decisões que mexem com o cotidiano de quem circula por Natal.
Frequentadores e moradores que cruzam a Avenida Prudente de Morais acompanham uma disputa que saiu do balcão para o Fórum. Uma sentença recente determinou mudanças rápidas no uso de um terreno no cruzamento com a Rua Sérgio Severo, cenário conhecido por quem passa por ali diariamente.
O que decidiu a justiça
O juiz Airton Pinheiro, da 4ª Vara da Fazenda Pública de Natal, reconheceu que o terreno onde funciona o bar Amarelinho pertence ao Estado do Rio Grande do Norte e determinou a desocupação do imóvel em até 30 dias. O prazo começará a contar quando não houver mais possibilidade de recursos. Se o cronômetro zerar sem saída voluntária, o Estado poderá assumir a posse direta do bem.
Ordem clara: 30 dias para desocupar após o fim dos recursos. Em caso de descumprimento, o Estado assume a posse de forma imediata.
Segundo o processo, a área foi incorporada ao patrimônio público estadual em janeiro de 2013. O governo apontou que, mesmo ciente da origem pública, o ocupante ergueu e manteve construção no local, o que motivou o pedido de restituição definitiva da área.
Por que o terreno é público
Na análise do magistrado, o Estado comprovou a cadeia dominial. O imóvel foi adquirido em 1955 pelo Banco do Estado do Rio Grande do Norte e, mais tarde, incorporado ao patrimônio estadual. A decisão citou o artigo 1.228 do Código Civil, que garante ao proprietário o direito de usar, gozar, dispor e reaver o bem de quem o possua injustamente.
- Prova da propriedade: documentos que demonstram a titularidade do bem pelo Estado.
- Identificação do bem: delimitação precisa do imóvel localizado na Prudente de Morais com a Sérgio Severo.
- Posse injusta: uso do terreno sem título válido, reconhecido pelo próprio ocupante ao admitir explorar o bar no local.
Súmula 619 do STJ: ocupação irregular de bem público é mera detenção, precária, sem direito de retenção ou indenização por benfeitorias.
O que disse a defesa
A defesa alegou que ocupa o imóvel desde 1956, mencionou tentativas anteriores do Estado de retomar a área e pediu o reconhecimento de usucapião. O juiz rejeitou o pedido. Argumentou que a Constituição veda usucapião sobre bens públicos, independentemente do prazo de ocupação e do tipo de posse apresentada.
Bens públicos não se adquirem por usucapião, ainda que a ocupação seja antiga e tenha benfeitorias.
Impacto para quem vive e trabalha na região
O cruzamento da Prudente de Morais com a Sérgio Severo concentra fluxo intenso, serviços e pontos de parada de quem se desloca entre bairros. A eventual saída do bar Amarelinho muda a dinâmica de trabalhadores, clientes e vizinhos. Pode reduzir a movimentação noturna, alterar rotas de consumidores e abrir espaço para novas destinações do terreno. Para comerciantes próximos, há efeito colateral: menos atração de público em determinados horários.
Para quem dirige, o processo de desocupação costuma gerar operações de retirada de estruturas e caminhões de mudança, o que interfere no trânsito por períodos curtos. Moradores devem acompanhar avisos oficiais sobre datas de ações no local quando o prazo processual se encerrar.
Linha do tempo do caso
| Data | Marco |
|---|---|
| 1955 | Imóvel adquirido pelo então Banco do Estado do Rio Grande do Norte. |
| 2013 | Área incorporada ao patrimônio do Estado do Rio Grande do Norte. |
| Decisão recente | Sentença reconhece domínio estatal e define 30 dias para desocupação após recursos. |
E se houver recurso?
A sentença admite recursos. Enquanto houver discussão válida nos autos, o prazo de 30 dias não começa. Quando o processo transitar em julgado, a contagem se inicia. Se a parte condenada não desocupar, o Estado pode requerer imissão imediata na posse, com apoio de órgãos responsáveis pela execução, inclusive remoção de estruturas e reforço policial se necessário.
- Antes do trânsito em julgado: prazo suspenso.
- Após o trânsito em julgado: 30 dias corridos para desocupar.
- Descumprimento: imissão do Estado na posse e retirada forçada das estruturas.
O que é usucapião e por que não vale para bens públicos
Usucapião é a forma de adquirir propriedade pelo exercício prolongado e pacífico da posse, com requisitos que variam conforme a modalidade (ordinária, extraordinária, especial urbana ou rural). Em áreas privadas, um ocupante pode, em determinadas condições, transformar posse em propriedade. O cenário muda quando o bem é público. A Constituição proíbe usucapião de bens pertencentes à União, estados, municípios e suas entidades. A jurisprudência do STJ consolidou que a ocupação irregular de bem público caracteriza detenção precária, sem gerar direitos de retenção ou indenização por benfeitorias não autorizadas.
Como um comerciante pode evitar riscos semelhantes
- Verificar a matrícula do imóvel no cartório de registro de imóveis e checar quem é o titular atual.
- Pedir certidões atualizadas e plantas com georreferenciamento para confirmar a exata localização do lote.
- Consultar a secretaria de patrimônio do governo estadual ou municipal quando houver suspeita de área pública.
- Formalizar contratos com cadeia dominial clara, com registros e averbações, antes de investir em obras.
- Guardar alvarás, licenças e eventuais autorizações de uso em processo administrativo, quando aplicável.
O que pode acontecer com o espaço após a saída
Quando o Estado retoma a posse de um imóvel público, abre-se a possibilidade de dar destinação compatível com políticas de patrimônio: uso administrativo, cessão a projetos específicos, concessão, ou preparação para eventual licitação de uso. Enquanto a administração define o próximo passo, o terreno pode receber vedações e sinalização para evitar novas ocupações irregulares.
Para moradores e comerciantes, acompanhar a destinação ajuda a antecipar efeitos práticos: mudanças de circulação, obras de manutenção ou projetos que tragam serviços e segurança. Em áreas com grande fluxo, como a Prudente de Morais, decisões sobre ocupação têm efeito direto na vizinhança e no comércio de bairro.
Dicas rápidas para o consumidor local
- Planeje rotas alternativas durante o período de desmobilização das estruturas.
- Verifique horários de funcionamento de serviços próximos, que podem se ajustar ao novo fluxo.
- Observe sinalizações temporárias e respeite áreas interditadas durante eventuais operações no cruzamento.
O caso deixa lições práticas sobre como a formalização da posse e da propriedade influencia a segurança jurídica de um negócio. Para quem empreende em áreas valorizadas e movimentadas, como a Lagoa Nova, checar documentos antes de construir, reformar ou ampliar previne perdas financeiras e interrupções repentinas de atividade.
Para os leitores interessados no tema jurídico, vale acompanhar como ações de reivindicação de domínio evoluem na prática. O processo exige prova documental sólida, identificação detalhada do bem e demonstração de posse injusta. Quando a área é pública, o debate se concentra mais na preservação do patrimônio do Estado e na proteção do interesse coletivo do que na antiguidade da ocupação.


