Helicópteros cruzaram o céu da Cidade Nova enquanto decisões sensíveis amadureciam longe das câmeras, com impacto direto no seu dia a dia.
Em um encontro reservado no Centro Integrado de Comando e Controle, Alexandre de Moraes, ministro do STF, e o governador Cláudio Castro ajustaram, face a face, o tom da política de segurança do Rio após uma operação que deixou um rastro de dúvidas e pressões.
Reunião discreta no centro de comando
O encontro começou no fim da manhã e se estendeu por quase duas horas. Moraes chegou e saiu de helicóptero, acompanhado de Castro. Ninguém falou com a imprensa. Nem assessores diretos entraram na sala. O foco, segundo o governo, passou pelo chamado projeto de “retomada” em discussão no Conselho Nacional do Ministério Público, além do balanço da grande operação nos complexos da Penha e do Alemão.
Ninguém deu entrevista. A conversa ocorreu a portas fechadas e concentrou a cúpula política e policial do estado.
Quem participou
Além do ministro e do governador, estiveram presentes:
- Victor Santos, secretário de Segurança Pública;
- coronel Marcelo de Menezes, secretário da Polícia Militar;
- delegado Felipe Curi, secretário da Polícia Civil;
- Renan Saad, procurador-geral do Estado;
- Antonio Edilio, representante do Conselho Nacional do Ministério Público;
- Waldyr Ramos, diretor da Polícia Técnica Científica.
121 mortos e a disputa por narrativas
A operação nos complexos da Penha e do Alemão terminou com 121 mortos, entre eles quatro policiais. O número elevou a temperatura do debate público e acendeu alerta sobre protocolos, transparência e respeito às decisões do Supremo que condicionam ações policiais em áreas densamente povoadas.
121 mortos, quatro policiais entre as vítimas e uma cobrança reforçada por controle externo e transparência.
Com o saldo humano em discussão, o encontro buscou equalizar expectativas: de um lado, a pressão por resultados contra o crime organizado; de outro, a exigência de legalidade estrita, preservação de vestígios e abertura total para fiscalização independente.
Por que a ADPF das Favelas pesa agora
Relator da ADPF das Favelas, Moraes acompanha de perto o cumprimento das balizas definidas pelo STF para operações no Rio. A ação constitucional estabelece limites, impõe registros detalhados e cria freios para reduzir riscos de violações e de destruição de evidências.
O que a decisão do STF exige
- Não remoção indevida de corpos sob pretexto de socorro, quando isso comprometer a cena do crime.
- Preservação de vestígios, objetos, cartuchos e marcas relevantes ao inquérito.
- Documentação fotográfica e esquemática dos locais, com armazenamento eletrônico dos registros.
- Disponibilização desses materiais para revisão independente por órgãos de controle.
Neste contexto, Moraes determinou que o governo fluminense preserve todos os elementos materiais relacionados à operação, incluindo perícias e a cadeia de custódia. A Defensoria Pública deve ter acesso pleno aos arquivos e condições para contraprovas periciais.
Moraes cobrou a preservação integral das provas e o acesso da Defensoria a todo o material pericial.
Cadeia de custódia sem atalhos
A cadeia de custódia é o caminho que a prova percorre desde a coleta até a apresentação em juízo. Qualquer salto, extravio ou manipulação sem registro mina a credibilidade da investigação. Em casos envolvendo mortes durante operações, esse trilho precisa ficar visível, datado e identificado por quem recolhe, transporta, armazena e analisa.
Como funciona na prática
- Coleta: peritos registram o local e recolhem o material com lacres numerados.
- Transporte: cada movimentação recebe registro formal, com horários, responsáveis e condições.
- Armazenamento: o material segue para local controlado, com acesso restrito e monitorado.
- Perícia: exames são fotografados, descritos e assinados, deixando rastro verificável para auditoria.
Itinerário institucional do ministro
Depois do encontro no CICC, Moraes seguiu para o Tribunal de Justiça do Rio e manteve nova conversa reservada com representantes do Judiciário. A agenda incluiu, na sequência, reuniões com o Ministério Público, a Defensoria Pública e o prefeito Eduardo Paes. A circulação por diferentes esferas busca alinhar protocolos e reforçar a interlocução entre quem investiga, quem acusa e quem governa.
O que muda para moradores e policiais
Para os moradores das áreas afetadas, o cumprimento rigoroso das regras da ADPF tende a trazer mais previsibilidade: cenas preservadas, menos remoções precipitadas e maior chance de esclarecer cada morte. Para os policiais, a responsabilização clara de procedimentos reduz disputas posteriores sobre a lisura das ações e confere segurança jurídica ao trabalho de campo.
Mais regras visíveis geram menos controvérsia: a operação precisa deixar um rastro documental que resista a auditorias.
Em linguagem direta, a mensagem é que as próximas operações devem nascer com o dossiê pronto: relatórios, fotos, croquis, vídeos de suporte e comunicação precisa sobre horários, locais e decisões táticas relevantes. A ausência desses elementos fragiliza inquéritos e alimenta descrédito social.
Perguntas que ficam e passos possíveis
O debate agora caminha por três trilhas: a aferição minuciosa das provas já geradas, a correção de falhas de procedimento e a articulação entre governo estadual, Ministério Público, Judiciário e Defensoria. O “projeto de retomada” mencionado pelo governo sugere uma agenda de médio prazo, com metas e prazos para reduzir áreas sob influência de facções sem romper o arcabouço legal definido pelo STF.
Indicadores a acompanhar
| Dimensão | Indicador | Finalidade |
|---|---|---|
| Operações | Registro fotográfico e de vídeo por ocorrência | Verificação independente e comparação temporal |
| Perícia | Tempo entre fato, coleta e laudo | Integridade da cadeia de custódia |
| Transparência | Disponibilização de dados a órgãos de controle | Controle externo e confiança pública |
| Resultados | Taxa de letalidade por operação | Efetividade com redução de danos |
Informações úteis para quem vive nas áreas afetadas
Familiares de vítimas podem solicitar cópia de laudos, fotos e registros do local do crime por meio da Defensoria Pública. Testemunhas devem guardar registros próprios, anotar horários, condições de luz, nomes ou codinomes de equipes e características de viaturas. Esse material auxilia perícias e garante contraprovas quando necessário.
Para policiais em atuação, câmeras corporais, relatórios padronizados e comunicação de decisão tática em tempo real fortalecem a prova e resguardam a equipe. Reduzem contestações futuras e sustentam a narrativa oficial com base documental.


