Um ícone de 1912 pode ganhar nova vida no coração de Santos, com usos que reacendem memórias e movimentam ruas.
A Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano apresentou, no Paço Municipal, a proposta para transformar a antiga Hospedaria dos Imigrantes em um complexo de moradia, comércio e lazer. O prédio tombado passará por restauro e adaptação de usos, com foco em ativar o bairro da Vila Nova e gerar empregos.
O que muda no prédio histórico
O estudo inicial prevê um conjunto multifuncional que mistura habitação com serviços, cultura e esporte. A ideia é trazer fluxo diário de moradores e visitantes, sem apagar a memória arquitetônica do imóvel, protegido pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Santos.
O plano aponta 286 apartamentos, 40 lojas, 87 salas comerciais, um cinema e uma quadra poliesportiva em um único endereço.
Mix de moradias e serviços
Os apartamentos se dividem em três tipologias — um, dois e três dormitórios — para atender perfis familiares distintos. O pavimento térreo tende a concentrar operações abertas à rua, com vitrines ativas para dar segurança, luz e movimento ao quarteirão.
| Item | Quantidade | Observação |
|---|---|---|
| Apartamentos 1 dormitório | 52 | Perfil compacto |
| Apartamentos 2 dormitórios | 182 | Atende famílias médias |
| Apartamentos 3 dormitórios | 52 | Maior metragem |
| Lojas | 40 | Frente ativa para a rua |
| Salas comerciais | 87 | Serviços e escritórios |
| Cinema | 1 | Âncora cultural |
| Quadra poliesportiva | 1 | Uso comunitário |
Da hospedaria que não hospedou ao armazém de café
O edifício nasceu em 1912, desenhado para acolher imigrantes. A função original não se confirmou e o imóvel ganhou destinos sucessivos: armazém de café, depósito de cooperativa de bananicultores e pátio de contêineres. Esse vai e vem explica a robustez estrutural e o pé-direito generoso.
A construção é eclética, com traços neocoloniais. O corpo principal é retangular, formado por duas alas que abraçam um pátio central. No térreo, as alas se conectam sob pé-direito de 6,20 m. No piso superior, com 7 m de pé-direito, uma varanda larga corre ao longo do conjunto, apoiada em pilares, onde ficariam dormitórios no projeto original.
Restaurar exigirá compatibilizar novas funções com a integridade de fachadas, vãos e elementos estruturais originais.
Impacto esperado no bairro da Vila Nova
O entorno deve sentir efeitos diretos de um equipamento que funciona o dia todo. Comércio atende quem mora, serviços atendem quem trabalha, e o cinema adiciona agenda cultural noturna. Essa combinação costuma reduzir imóveis ociosos e melhorar a iluminação pública pelo uso contínuo.
O que pode mudar para os moradores
- Mais gente circulando em horários variados, com efeito na segurança urbana.
- Novas oportunidades de trabalho em lojas, serviços e manutenção predial.
- Valorização de imóveis vizinhos, com risco de pressão sobre aluguéis.
- Demanda por transporte, vagas e sinalização, pedindo ajustes na mobilidade local.
- Agenda de cultura e esporte dentro do complexo, aberta ao bairro conforme regramento futuro.
Como o projeto avança
O plano está na fase de estudos técnicos e arquitetônicos. A equipe trabalha em diagnóstico do edifício, diretrizes de restauro, soluções de acessibilidade e compatibilização entre pé-direitos históricos e instalações novas.
Próximos passos incluem consolidar o desenho urbano, fechar parcerias e publicar o cronograma de obras após aprovações patrimoniais.
Perguntas que devem orientar o debate público
- Qual a fração destinada a aluguel social ou a faixas de renda específicas?
- Como garantir tarifas acessíveis no cinema e na quadra para quem mora no entorno?
- Que medidas de trânsito, transporte coletivo e ciclovias entram no pacote?
- Quais peças do edifício serão restituídas, preservadas ou requalificadas?
- Como funcionará a curadoria de lojas para evitar monotonia comercial?
Santos AE macuco amplia a frente habitacional
Na mesma apresentação, a CDHU levou um segundo projeto ao debate: o Santos AE Macuco, em área de 30 mil m² da CPTM, entre as avenidas Siqueira Campos, Senador Dantas e a Rua Padre Anchieta. A proposta soma 1.769 unidades, combinando Habitação de Interesse Social (762 moradias para renda de até seis salários mínimos) e Habitação de Mercado Popular (1.007 moradias para renda de até dez salários mínimos). O conjunto prevê comércio, serviços e equipamentos públicos, com cerca de 170 mil m² de área construída.
A leitura conjunta dos dois movimentos sinaliza uma estratégia: ativar quadras subutilizadas com moradia próxima a emprego e serviços. O efeito desejado é reduzir deslocamentos longos e criar rotas de pedestre e bicicleta interligadas.
Custos, prazos e governança
Como os dois projetos seguem em estudo, orçamento detalhado e fases de obra ainda serão definidos. Os próximos meses tendem a trazer termos de parceria, modelagem de operação do cinema e das áreas esportivas, regras de seleção de moradores e a etapa de licenciamento patrimonial.
A preservação do valor histórico e o acesso democrático a moradia e cultura precisam caminhar juntos no desenho final.
O que isso significa para você
Quem mora ou trabalha na região deve preparar-se para um ciclo de obras e mudanças de fluxo. O comércio de bairro pode ganhar nova clientela com as lojas do térreo e as salas comerciais. Famílias interessadas em se candidatar a moradias devem acompanhar os futuros editais com critérios de renda, composição familiar e priorização.
Vale considerar cenários: uma família de três pessoas, com renda em faixa média, pode mirar apartamentos de dois dormitórios, próximos de serviços essenciais. Profissionais autônomos tendem a se beneficiar de salas comerciais no mesmo quarteirão do lar. Para quem teme pressão em aluguéis, audiências públicas e estudos de impacto urbanístico podem trazer medidas de mitigação, como fases de entrega, metas de comércio de bairro e limites de uso intensivo em horários sensíveis.
Patrimônio exige soluções específicas. Técnicas como limpeza de fachada com jato controlado, recuperação de argamassas históricas e reforço estrutural discreto preservam a leitura original. Em interiores, mezaninos leves e shafts concentrados reduzem interferência em vãos e permitem manutenção barata no longo prazo. Essas escolhas afetam custos, prazos e a qualidade da experiência para quem ocupará o espaço.
O desenho de mobilidade também entra no centro das decisões. Linhas de ônibus, bolsões para carga e descarga, bicicletários e calçadas acessíveis definem o sucesso do térreo ativo. Um cinema de bairro atrai picos noturnos; por isso, iluminação, vigilância por presença e rotas seguras de retorno tornam-se parte do projeto, não complemento.


